Críticas


DESOBEDIÊNCIA

De: SEBASTIÁN LELIO
Com: RACHEL WEISZ, RACHEL McADAMS, ALESSANDRO NIVOLA
20.06.2018
Por Maria Caú
O amor impossível e os universos fechados da contemporaneidade devassada.

Se o amor impossível é ainda um conceito que fascina, como justificá-lo nas narrativas contemporâneas, em geral ambientadas num universo em que Capuletos e Montecchios não têm mais o poder de obstáculos intransponíveis? Uma das teorias que dão conta do recente sucesso dos dramas cinematográficos centrados na paixão proibida entre personagens LGBT+ se funda justamente na manutenção do interdito da homossexualidade em alguns contextos sociais ou religiosos particularmente conservadores, infelizmente ainda muito reais. Essa é justamente a premissa de Desobediência, expressa já no título.

O longa, baseado no romance homônimo da inglesa Naomi Alderman, narra o retorno de Ronit (Rachel Weisz) para a comunidade de judeus ortodoxos em que cresceu, a fim de participar das homenagens fúnebres a seu pai, um rabino com quem cortara contato anos antes. Lá chegando, Ronit reencontra familiares e conhecidos, em especial Esti (Rachel McAdams), a mulher com quem ela teve um romance marcante de juventude, agora casada e ocupando uma destacada posição naquela hierarquia social bastante rígida. A presença da filha renegada do rabino causa um disrupção naquele universo, em especial na vida de Esti e seu marido Dovid, que hospedam a moça.

O diretor chileno Sebastián Lelio, que no ano passado tratou da questão da transexualidade com seu multipremiado Uma mulher fantástica, consegue mapear de forma bastante palpável o universo dos judeus ortodoxos. De fato, o ponto alto do filme é sua capacidade de delinear as nuances do embate entre essa realidade fechada e os novos hábitos de Ronit, que trabalha como fotógrafa na grande metrópole de Nova York. Não por acaso, o diretor escolhe retratar os interiores como espaços herméticos, com janelas cerradas ou cortinas que se erguem umas sobre as outras. Outra escolha interessante é a abundância de planos próximos que, aliada às cores esmaecidas de uma fotografia cinzenta, parece querer ampliar a claustrofóbica sensação de proximidade com esse ambiente frio e pouco acolhedor. Os diálogos de apresentação são, a um só tempo, intensos e perfeitamente econômicos, e revelam aos poucos a boa química entre as protagonistas, ainda que a trilha sonora opressiva muitas vezes prejudique a imersão do espectador no romance.

O desenvolvimento, no entanto, não mantém o mesmo vigor, e acaba por apressar os conflitos e apresentá-los de maneira um tanto esquemática/maniqueísta, mesmo que traga a novidade de alternar o protagonismo entre as personagens, mostrando o cotidiano de Esti, que se torna fundamental para a compreensão das suas atitudes.

ATENÇÃO: No próximo parágrafo, um pequeno spoiler

O desfecho é igualmente pouco convincente, ainda que o longa tenha o mérito de não cair num dos clichês mais comuns dos filmes lésbicos: o final inteiramente trágico. Em Desobediência, o desenrolar vacila entre muitos pequenos (falsos) finais, que acabam por deixar o espectador progressivamente menos interessado.

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