Críticas


O PRIMEIRO HOMEM

De: DAMIEN CHAZELLE
Com: RYAN GOSLING, CLAIRE FOY, COREY STOLL
19.10.2018
Por Marcelo Janot
Transmite a sensação de estar na pele de Neil Armstrong e compartilhar de suas angústias e emoções

Em 1968, um ano antes de o homem pisar na lua, Stanley Kubrick materializou o desconhecido nas imagens de “2001, Uma Odisseia no Espaço”. A sensibilidade artística de um gênio cinematográfico resultou em algo tão impressionantemente convincente que depois houve quem garantisse que as imagens de Neil Armstrong pisando em solo lunar teriam sido encenadas em estúdio por Kubrick, com o objetivo de ocultar um suposto fracasso da expedição da Nasa.

Cinco décadas após o feito de Armstrong, o desafio de relembrar cinematograficamente o episódio consiste em tentar oferecer algo novo para quem já sabe como a história termina. Em “O Primeiro Homem”, o algo novo pode ser uma homenagem implícita à obra-prima de Kubrick. Numa das primeiras missões espaciais de Armstrong, quando ele atinge a órbita terrestre, a visão de nosso planeta à distância vem acompanhada de uma valsa na trilha sonora, sugerindo, pela referência visual e musical a “2001”, que a ficção é capaz de transcender a realidade.

O filme dirigido por Damien Chazelle (“La La Land”, “Whiplash”) também proporciona algo inédito para aqueles que acompanharam o desembarque da Apollo 11 na lua como uma final de Copa do Mundo em pequenas TVs preto e brancas: a sensação de estar na pele de Armstrong e compartilhar de suas angústias e emoções. Para isso, contribuem a fotografia de Linus Sandgren e a montagem de Tom Cross, privilegiando mais os closes e os claustrofóbicos ambientes internos do que a vastidão do espaço.

Embora “O Primeiro Homem” trate da proeza histórica de um americano, o roteiro de Josh Singer (vencedor do Oscar por “Spotlight”) evita o tom ufanista. Percebemos como o governo levou adiante a missão lunar às custas de propaganda enganosa e da vida de astronautas. Tampouco a bandeira americana é mostrada tremulando na lua. A habitual introspecção de Ryan Gosling contribui para desglamurizar o heroísmo de Armstrong. Sua obstinação (presente nos protagonistas dos filmes anteriores de Chazelle) é alimentada pela necessidade psíquica de enfrentar a mortalidade, que irrompe em sua vida na perda precoce da filha pequena, no início do filme, e dos companheiros que ficaram pelo caminho.

A forte presença da esposa Janet (Claire Foy) e a ênfase na vida em família dos astronautas (a ótima trilha sonora de Justin Hurwitz privilegia a delicadeza da harpa, ajudando a humanizar os personagens) reforçam a opção pelo retrato intimista de Armstrong, mostrando que sua chegada à lua foi, antes de um gigantesco salto para a humanidade, um grande passo para ele mesmo.

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