Críticas


MARCELLO, UMA VIDA DOCE

De: MARIO CANALE e ANNAROSA MORI
13.10.2006
Por Luiz Fernando Gallego
HAGIOGRAFIA AFÁVEL

O documentário Marcello, uma Vida Doce pode matar um pouco da saudade de um dos atores mais carismáticos da história do cinema, amado pelo público e cortejado por cineastas como Ettore Scola, Irmãos Taviani, Vittorio De Sica, Marco Ferreri, Valerio Zurlini, Elio Petri, Nanni Loy, Marco Bellocchio, Pietro Germi e Mauro Bolognini, - só para citar alguns dentre muitos outros compatriotas seus, incluindo a santíssima trindade do grande cinema italiano dos anos 1960/70: Visconti, Fellini e Antonioni. Com quase todos estes filmou mais de uma vez. E diretores das mais variadas nacionalidades também o requisitaram: o inglês John Boorman, o americano Robert Altman, o francês Louis Malle, o grego Theo Angelopoulos, o chileno Raul Ruiz, o português Manoel de Oliveira e o russo Nikita Mikhalkov. Além do nosso brasileiro Bruno Barreto em uma - ainda que pálida - versão de Gabriela, Cravo e Canela para as telas.



É impossível lembrar todos os diretores e filmes importantes que contaram com Mastroianni enriquecendo o resultado final do que chegou aos cinemas, já que sua filmografia se aproxima do número de 150 títulos! Do mesmo modo, um documentário de 90 minutos teria que forçosamente deixar de fora dezenas e dezenas de momentos fundamentais da história profissional de Marcello - e da história do cinema - já que o ator esteve, entre outros, nos marcantes 8 ½, A Doce Vida, A Noite, O Belo Antonio, Os Companheiros, Casanova e a Revolução, Um Dia Muito Especial, A Comilança, Allonsafan - e em sucessos estimados pelo grande público com qualidades cinematográficas que raramente encontramos nos projetos populares de hoje em dia ao retratar costumes e épocas, como em Divórcio à Italiana, Ontem, Hoje e Amanhã e Eternos Desconhecidos, só para citar os mais falados em seu tempo.



Este pequeno inventário se faz necessário ao comentarmos o filme de Mario Canale e Annarosa Morri, que insiste muito na tão falada preguiça de Mastroianni como um paradoxo: como ser famoso por seu comodismo, filmando tanto? Ninguém usa o termo workahoolic, mas a sugestão é forte. Paixão pelas conquistas amorosas e pela boa mesa são mencionadas, respectivamente, com mais e menos pudor, sendo estranha a ausência da atriz Catherine Deneuve nos depoimentos, parceira que foi de alguns filmes e mãe de sua filha e também atriz, Chiara - que faz vários aparições falando dele como pai. Também vemos e escutamos muito sobre papai Marcello da boca de Barbara, filha da esposa oficial Flora Mastroianni, atriz bissexta e pouquíssimo conhecida, casamento eterno que ele nunca desfez apesar dos inúmeros casos com diversas colegas de elenco.

Na seção Caras do filme é dito que ele nunca conseguiu nada além com Claudia Cardinale, com quem o tempo acabou por ser cruel em sua aparição atual - ainda mais quando se revêem algumas cenas de sua beleza deslumbrante de juventude em trechos de filmes antigos. Alguma coisa mais maliciosa é dita sobre Marcello querer ficar no leito com a partner de tantos filmes, Sophia Loren e o marido dela, o produtor Carlo Ponti, numa piadinha mal explicada.



Ao contrário da fala de Ettore Scola, a maioria dos depoimentos, ainda que simpáticos, como os do irmão e montador Ruggero Mastroianni e do músico Armando Trovaioli, pouco dimensionam o homem ou o mito Mastroiani, muito elogiado por sua performance teatral num musical sobre Rodolfo Valentino que não diz muito ao público que só o viu nas telas. O ator despertava enorme empatia e revê-lo é como encontrar um velho conhecido neste documentário afável que pouco acrescenta, sendo uma espécie de hagiografia mundana sobre seu obeto de atenção.



A narração de Sergio Castellitto, talvez o maior ator italiano da atualidade, é um ponto forte num filme que, por mais que seja simpático, não deixa de ser frustrante em sua superficialidade.





# MARCELLO, UMA VIDA DOCE (MARCELLO, LA DOLCE VITA)

Itália, 2006

Direção: MARIO CANALE e ANNAROSA MORI

Narração: SERGIO CASTELLITTO

Duração: 94 minutos

Voltar
Compartilhe
Deixe seu comentário