Críticas


ANOS 90

De: JONAH HILL
Com: SUNNY SULJIC, LUCAS HEDGE, KATHERINE WATERSTON
30.05.2019
Por Maria Caú
Prematuramente envelhecido, o filme parece pertencer à época que procura retratar

Se passando num passado reconstituído de forma mais ou menos fidedigna ou até mesmo num futuro distópico, é preciso que uma obra cinematográfica diga alguma coisa sobre o presente, o momento em que foi lançada ou concebida, ainda que esse processo se dê pelas vias da ironia ou do contraste. Não que o discurso precise ser óbvio, ou excessivamente marcado, mas a arte é necessariamente produto das reflexões do seu tempo. Quando se recusa a fazer isso, o cineasta acaba muitas vezes com um produto prematuramente envelhecido, deslocado, que carece de vitalidade. Este é justamente o problema de Anos 90, estreia na direção de longas-metragens do ator Jonah Hill, conhecido por filmes como O lobo de Wall Street e Superbad. O título (no original, Mid90s) parece aqui dolorosamente literal, uma vez que a obra poderia ter sido produzida à década que busca retratar, com roteiro e situações que muitas vezes parecem compor uma versão apropriada para menores dos (superestimados) filmes de Larry Clark, em especial o cultuado Kids.

Essa impressão se confirma ainda na temática: o enredo se centra nas experiências de Stevie (Sunny Suljic), um menino de 13 anos, que, alvo da violência do irmão mais velho e razoavelmente negligenciado pela mãe solteira, encontra conforto na tentativa de pertencimento a um grupo de meninos skatistas que, advindos de lares nada estruturados, passam seus dias treinando o esporte, frequentando festas e se entregando a algumas experimentações com álcool e drogas. A narrativa então se concentra nas relações masculinas, seus grupos e rituais de aceitação e, ainda que o tema seja legitimamente interessante, a falta de qualquer personagem feminina bem delineada torna o filme ainda mais antiquado, especialmente porque o roteiro perde a oportunidade de delinear minimamente a mãe, que, apesar de se fazer presente em diversas cenas, não passa do arquétipo da mulher relapsa, avoada, ligeiramente culpada por sua inabilidade com a maternidade, tarefa à qual se entregou jovem demais, sem qualquer preparo e apoio. Mais grave: em alguns momentos a trama parece condená-la de forma bastante precipitada, numa solução fácil e pouco inspirada. Também o irmão, interpretado por Lucas Hedges, carece de qualquer aprofundamento por parte de um roteiro bastante preguiçoso e que recorre vezes demais aos clichês do gênero.

Anos 90 foi filmado em película 16mm, escolha de outra estreia dos últimos meses que também leva um ano no título, O ano de 1985. Mas, se neste último a fotografia funciona satisfatoriamente, aqui o aspecto vintage, reforçado pela janela 4:3, parece mais um elemento a posicionar o filme irremediavelmente duas décadas e meia atrás. Outro problema é a edição de som, essa sim bastante deficitária, com saltos sonoros canhestros em meio a diálogos.

O cenário do longa é a Califórnia, mais especificamente Los Angeles – e aqui sabemos a importância desse lugar para a popularização do skate como o conhecemos hoje: foi ali que os Z-Boys revolucionaram as manobras utilizando as piscinas deixadas vazias pela grande seca de meados dos anos 1970, trazendo elementos do surf para esse universo. Nesse contexto, as sequências dedicadas ao esporte são um dos pontos altos do filme, e fica claro que os atores são profissionais da área, já que executam movimentos de grande complexidade, como nose slides ou ollies por sobre obstáculos altos, e de modo geral não parecem recorrer a dublês. Também a ótima atuação do protagonista, bastante multifacetada, e impressionante dada sua tenra idade, e o fato de que o filme se recusa a ceder por inteiro à violência que cerca e ameaça os personagens, criando para eles um bolsão de acolhimento, são destaques positivos a serem sublinhados.

Menos feliz é o desfecho, que se recusa de maneira quase pueril a examinar – e não seria necessário resolver, mas tão somente reconhecer – os conflitos que haviam sido desenhados, optando por um final autorreferente e que completa a ode a essa época a que o filme parece querer pertencer.





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