Críticas


SANTIAGO, ITÁLIA

De: NANNI MORETTI
Com: NANNI MORETTI
23.06.2019
Por Maria Caú
A importância do tema se sobressai ao convencionalismo do documentário

Nos tempos atuais, é inegável a importância de documentários que revisitem as ditaduras civil-militares latino-americanas, revelando-as em toda a sua crueza e todo o seu horror. Esse papel Santiago, Itália cumpre perfeitamente bem, ainda que se trate de um filme bastante convencional, delineando o regime ditatorial chileno a partir do duo mais comum do documentário histórico: múltiplas entrevistas e material de arquivo usado de forma ilustrativa. Assim, o filme se organiza em três eixos temáticos, sendo os dois primeiros duas fases contrastantes da história do país: a eleição de Allende (seus anos de governo e a euforia e a esperança que tomaram conta da juventude); o golpe militar, com a chegada de Pinochet ao poder com o apoio norte-americano, seguida da brutal repressão, com perseguições, torturas, morte, toque de recolher e todas essas monstruosidades.

Essas duas primeiras seções conservam o interesse por conta do caráter genuíno das entrevistas, que vão do emocionante ao curioso ou até engraçado, passando por um dos pontos altos do filme, o depoimento de um ex-torturador, que causa engulhos ao tentar se defender das acusações que lhe são imputadas para depois interpelar o diretor Nanni Moretti, incomodado com suas perguntas e afirmando que só aceitara participar do filme por acreditar que a abordagem seria “imparcial”. O realizador responde, para ele e também – por que não? – para o público: “Eu não sou imparcial”.

A terceira parte, de longe a mais original e interessante, revela fatos bem menos conhecidos e explica o título do filme, tratando do papel da embaixada italiana na proteção a dezenas de perseguidos políticos, que pulavam seus muros para se refugiarem nesse espaço fora dos domínios do virulento governo. Esses jovens permaneceram ali por meses, mesmo sem quaisquer relações com a Itália, e contam sobre essa experiência tão insólita. Às vezes parece que falam de uma colônia de férias, em outras temos certeza da tragicidade do quadro, e é esse exercício elástico de memória fundada na sensação de potência infinita da juventude a grande qualidade do filme. Por fim, lamenta-se que essa passagem cumpra apenas um terço do filme, ou que a sua estrutura seja tão engessada e forçosamente cronológica, incluindo o terrível prenúncio final, por demais destacado.

Voltar
Compartilhe
Deixe seu comentário