Críticas


TED BUNDY – A IRRESISTÍVEL FACE DO MAL

De: JOE BERLINGER
Com: ZAC EFRON, LILY COLINS, KAYA SCODELARIO, JOHN MALKOVICH, HALEY JOEL OSMENT
31.07.2019
Por Maria Caú
Incapaz de aderir à proposta que desenha, e com elenco e direção fracos, o filme resulta banal

Theodore “Ted” Robert Bundy é sem dúvida alguma o assassino serial mais célebre da era moderna. Ao lado de Ed Gein, que serviu de inspiração para o Norman Bates de Psicose, ele ajudou a cristalizar a imagem cinematográfica do serial killer, inspirando inúmeros cineastas (algumas de suas táticas aparecem até em Silêncio dos inocentes) e atores. Assim, quando pensamos no assassino em série como um homem bonito, charmoso, elegante, culto, acima de qualquer suspeita aparente e que tem arroubos súbitos de violência descontrolada apenas contra um grupo de vítimas muito bem demarcado (no caso, mulheres bem jovens, brancas, de cabelo preto liso repartido ao meio), estamos pensando em Bundy, e a verdade é que este perfil se enquadra muito pouco com a realidade desses criminosos, demonstrando a fascinação midiática com a imagem projetada calculadamente por Ted em seus anos de prisão.

Ted Bundy – a irresistível face do mal aposta na proposta de revelar a ambivalência fundamental do assassino, descrito por todos que o conheceram social ou intimamente como uma pessoa doce, educada e até carinhosa, utilizando para isso a perspectiva de Liz Kloepfer, ex-companheira de Bundy que escreveu o livro em que o roteiro se baseou. O longa, no entanto, é incapaz de aderir inteiramente à proposta que desenha, e é certo que ele seria mais bem-sucedido em apresentar essa disparidade entre as personas de Ted se a narrativa se limitasse a revelá-lo apenas através dos olhos de Liz, em vez de seguir com ele em alguns de seus momentos na prisão ou em perseguições policiais. Perdido no meio do caminho, e com elenco bastante fraco (Zac Efron é incapaz de dar corpo ao misto de charme narcisista e polidez fria e assustadora de Bundy, que era ele mesmo um grande ator, e a caracterização não ajuda), o filme resulta banal, e até tedioso, já que não há (quase) ninguém que ainda acredite na inocência de Ted, único elemento que poderia ser manipulado nesse contexto.

Quando do seu lançamento nos Estados Unidos, o filme, produção da Netflix, foi intensamente criticado por acabar apresentando uma imagem por demais benevolente de Ted. No entanto, ele não é inacurado nesse aspecto: a própria Ann Rule, autora de uma série de best sellers americanos sobre crimes reais, conhecera Ted e admite diversas vezes em seu ótimo livro Um estranho ao meu lado jamais ter nutrido qualquer desconfiança com relação a ele, tendo até o defendido quando das primeiras acusações. De fato, Rule trabalhou com ele num centro de prevenção ao suicídio, em turnos noturnos em que estavam sozinhos, e se sentia confortável em sua companhia, além de admirar a forma como Ted conduzia as conversas ao telefone com empatia. No entanto, se o filme não é falacioso nesse sentido, ele é pueril em sua representação da doçura e do magnetismo de Ted, com cenas que beiram o constrangedor, como aquela em que todas as moças de uma biblioteca ficam hipnotizadas com a sua simples presença no ambiente.

O desfecho é particularmente equivocado, e as cenas de tribunal são um verdadeiro desperdício de fatos mirabolantes e demonstrações de narcisismo fascinantes, mal transportadas para a tela (como juiz, John Malkovich tem alguns momentos interessantes). O diretor Joe Berlinger não consegue acertar o tom dessas passagens, e exagera na interação final entre Liz e Ted, resvalando na caricatura. É importante pontuar que Berlinger tem uma carreira interessante na seara documental voltada a crimes reais, tendo dirigido a trilogia Paradise Lost. Sobre o próprio Ted e também da Netflix, mais vale assistir a outra obra do diretor: a série Conversando com um serial killer: Ted Bundy, essa sim com alguns elementos inéditos e assustadores sobre esse personagem tão complexo e mesmerizante.

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