Críticas


A GRANDE MENTIRA

De: BILL CONDON
Com: IAN McKELLEN, HELEN MIRREN, RUSSELL TOVEY, JIM CARTER
20.11.2019
Por Luiz Fernando Gallego
Há um show de interpretação de McKellen, mas o roteiro é previsível demais para conseguir surpreender (como pretende).

Diretor do ótimo Deuses e Monstros (1998) e do razoável Kinsey: vamos falar de sexo (2004), desde então Bill Condon assinou muitos filmes desinteressantes, medíocres ou ruins. Podíamos esperar um bom momento da reunião de Condon com o grande Ian McKellen que, por Deuses e Monstros foi indicado a um Oscar que Roberto Begnini recebeu (!)... Mas, infelizmente, não foi desta vez. Em todo caso, se existe alguma coisa que pudesse recomendar este  A Grande Mentira é o show de composição do personagem que McKellen nos dá, física e psicologicamente, cheio de nuances corporais, de voz e de mímica facial - apesar do tipo que ele encarna ser quase tão insustentável quanto o enredo que pretende surpresas de reviravoltas que só não são previsíveis para quem não viu filmes deste subgênero nos últimos quarenta e cinco anos.

Unir Helen Mirren a McKellen também seria uma ótima ideia se o roteiro não fosse tão autocomplacente na pretensão de surpreender, sendo que há muitas pistas já no prólogo em que os personagens se comunicam através de um site de relacionamento com as mentiras frequentes de quem usa esse dispositivo. E sendo o título original do filme The Good Liar, o que o ‘Roy’ de McKellen logo se revela: um grande trambiqueiro que também finge para a Estelle de Helen Mirren que logo "confessa" que se chama Betty.

A dupla de atores merecia coisa bem melhor, e o público não deveria ser tão exigido na “suspensão da descrença”, tamanha a inverossimilhança de quase todos os elementos do enredo - o que até pode funcionar em roteiros mais bem elaborados, quando a gente se diverte em ser bem enganado. Aliás, se leram alguma coisa sobre este filme mencionando Hitchcock, esqueçam: deve ser coisa de quem nunca viu seus filmes e nem ao menos sabe que Hitch odiava esconder coisas do espectador; para ele, o “suspense” implicava em mostrar ao público algo que seus personagens desconheciam, sendo isto que deixava a plateia tensa, por saber de um perigo que os heróis e heroínas não sabiam existir. Quando ele brincou de surpreender depois de várias dissimulações ao longo do enredo fez uma obra-prima, Psicose. Mas com este filme estamos a milhões de anos-luz de Hitchccock

ATENÇÃO: SPOILERS VÁRIOS

Apesar de ser ótima atriz, Helen Mirren não consegue convencer com a falsa ingenuidade de Betty: a persona da atriz interfere na sua composição, ainda que ela faça tudo que faria uma idosa naïve, o que, ao mesmo tempo, a personagem indica não ser (problema do roteiro mal estruturado). Mas a resistência dela contra as advertências frequentes do “neto” Stephen (Russel Tovey) ultrapassa qualquer bom senso mínimo.

Assim como na primeira vez em que a identidade de Roy é desmascarada por Stephen, a cena montada pelo rapaz não faz o menor sentido já que o jovem estava a serviço de Betty para que ela tentasse realizar uma "elaborada" vingança longuissimamente acalentada.

Quem não irá imaginar que, sendo a língua inglesa tão comum para os dois gêneros, The Good Liar não seria apenas Roy, quando o título brasileiro tentou driblar a ambiguidade do original recorrendo à neutralidade de “A Grande Mentira” sem especificar quem seria o/a bom/boa mentiroso/a?

Mencionamos acima que seria preciso que o espectador não visse filmes de surpresinhas que aparecem só nos 45 minutos do segundo tempo há 45 anos porque este é o tempo que separa o filme atual de "O Golpe de mestre" (The Sting), de 1973, lançado no Brasil no ano seguinte. Mas também não há comparação entre os dois.

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