Críticas


MEMÓRIA DO MOVIMENTO ESTUDANTIL

De: SILVIO TENDLER
Com: AMIR HADDAD, CHICO DIAZ, DIRA PAES
10.08.2007
Por Carlos Alberto Mattos
VERÁS QUE UM FILHO TEU NÃO FOGE À LUTA

É estranho ver José Serra, José Genoíno, Arnaldo Jabor, Zé Dirceu, César Maia e Vladimir Palmeira reunidos num mesmo filme, como se todos estivessem do mesmo lado. Estiveram, por um momento, quando eram militantes universitários na década de 1960. Suas diferenças se anulam enquanto falam do passado nos dois médias-metragens que Silvio Tendler dirigiu para o projeto Memória do Movimento Estudantil. Os filmes chegam hoje (sexta-feira) ao Cine Odeon (diariamente às 17h com entrada franca) e passam na TV Futura no sábado (20h30) e no domingo (21h), com reprises nos dias 14 e 15, sempre às 23h30.



O projeto, bastante amplo (conheça o site), reuniu recursos e ações da Petrobras, Fundação Roberto Marinho, União Nacional dos Estudantes, Museu da República e TV Globo. Começou em 2004 com uma campanha nacional de coleta de materiais para o acervo da UNE. A historiadora Maria Paula Araújo preparou o livro Memórias Estudantis 1937-2007: da fundação da UNE aos nossos dias, que está sendo lançado agora, quando a instituição completa 70 anos.



Os filmes de Tendler partiram de 300 horas de depoimentos já gravados em cromaqui para o projeto. Ele agregou outras entrevistas, uma boa pesquisa de cenas de arquivo e uma série de materiais de apoio que representam o grande risco do trabalho. São frases e poemas “grafitados” na tela, vinhetas encenadas com o grupo Tá na Rua, a cantora goiana Maíra e os atores Dira Paes e Chico Diaz, além de uma apresentação desnecesssária e deslocadamente “dramática” de Cássio Gabus Mendes.



O eterno “coração de estudante” de Tendler faz com que ele mergulhe no tema guiado pela emoção. No primeiro filme, Ou Ficar a Pátria Livre ou Morrer pelo Brasil, líderes e ativistas de várias épocas relembram a história da UNE, da simples criação da Casa do Estudante às micro-lutas dos tempos atuais, passando pela UNE volante, a luta contra a ditadura, os caras-pintadas etc. No fluxo de rememorações, não há espaço para muita análise.



Esta comparece escassamente também no segundo tomo, O Afeto que se Encerra em Nosso Peito Juvenil. Nele prevalecem as histórias curiosas (algumas excelentes) sobre as ações culturais do CPC, a vida na prisão e no exílio. Se os depoimentos aqui soam mais pessoais e mais vivos, a intervenção mais freqüente de encenações teatrais dilui o interesse. O problema não é de fundo, mas de forma. Da maneira “pura” como estão representados nos filmes, sem releitura nem distanciamento, aqueles textos e músicas perdem o calor do passado e soam hoje apenas politicamente ingênuos. (Se bem que Amir Haddad no papel de anjo da guarda das multinacionais seja um achado e tanto.)



A importância desse trabalho, é claro, não está na sua forma estética, mas no valor de recuperação histórica. É uma chance, por exemplo, de ver parte do precioso registro em Super 8 da demolição do prédio da UNE em 1979, feito por Clóvis Molinari. Ou a bela montagem de cenas das lutas estudantis de 1968, talvez o auge de todo o movimento. Ou, ainda, de flagrar controvérsias como esta: no primeiro filme, Vladimir Palmeira afirma que o movimento era eminentemente político, mas que acabava gerando uma cultura. No segundo, Zé Dirceu (visivelmente minimizado na edição) sustenta exatamente o contrário: era um movimento cultural, que adquiria feições políticas em função da ditadura.



Se o filme tivesse uma característica mais crítica que emocional, a edição certamente teria aproximado – e valorizado – esse desacordo. Ele pode ser mais que semântico.



Visite o DocBlog do crítico.



MEMÓRIA DO MOVIMENTO ESTUDANTIL

Brasil, 2007

Direção, roteiro e texto:
SILVIO TENDLER

Fotografia: MUSTAPHAT BARAT

Montagem: BERNARDO PIMENTA

Som: ALOÍSIO COMPASSO

Pesquisa: PAULA FABIANA, RENATA VENTURA

Elenco: AMIR HADDAD, CHICO DIAZ, DIRA PAES, GRUPO TÁ NA RUA, B NEGÃO, MAÍRA LEMOS, THIAGO MOCOTÓ

Narração: CÁSSIO GABUS MENDES

Duração: 2 x 50 minutos





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