Críticas


FESTIVAL DO RIO 2007: DE VOLTA À NORMADIA

De: NICOLAS PHILIBERT
25.09.2007
Por Daniel Schenker
SOBRE A PASSAGEM DO TEMPO

De Volta à Normandia é narrado em primeira pessoa. Trata-se de um dado importante desse projeto de Nicolas Philibert. O diretor, que trabalhou como assistente de direção de René Allio durante a realização, em 1975, de Eu, Pierre Rivière, que degolei minha mãe, minha irmã e meu irmão , volta à região da Normandia, mas não com o único intuito de retomar contato com os não-atores recrutados para o filme naquela época.



Há uma busca mais íntima que move o cineasta: o resgate da imagem do próprio pai, Michel Philibert, que interpretou um pequeno papel na produção de Allio, eliminada no corte final. Nicolas Philibert sai à cata da versão original e encontra a seqüência em que o pai aparece. Mas a seqüência ressurge sem som, sinalizando uma impossibilidade de recuperar o passado. Pode-se trazer à tona uma imagem, mas não a experiência propriamente dita.



As transformações decorrentes da passagem do tempo já eram um fato determinante no próprio filme de René Allio, que, ao recriar, como o próprio título indica, os assassinatos cometidos por um jovem camponês, Pierre Rivière, na primeira metade do século XIX, viu-se obrigado a afastar-se da exata localidade onde os fatos se deram simplesmente porque as mudanças na região desfiguraram a ambientação original.



Allio procurou suprimir distâncias ao filmar com camponeses da região. No entanto, apesar do esforço do diretor em extrair autenticidade de seu elenco de não-atores, estes realizaram uma leitura dos personagens, por mais amalgamados com “eles” que tenham se sentido durante o processo de trabalho e por mais próximos que sejam dos seus cotidianos. “É como se lhes devolvesse a própria história”, afirma Philibert, expressando mais uma impressão do que algo realmente possível. De Volta à Normandia resulta, isto sim, de camadas de apropriação: de René Allio em relação aos relatos deixados por Pierre Rivière antes de se suicidar na prisão; dos não-atores em relação aos personagens que interpretaram; e de Nicolas Philibert em relação aos escritos e ao próprio filme de Allio.



Todas essas releituras não implicam num esforço de fidelidade aprisionadora. O artista é, certamente, livre para criar a sua obra. Mas Philibert toca, pelo menos em duas cenas, no limite da ética: na primeira, ao não desligar a câmera no momento em que uma entrevistada pede para que o faça, e na segunda, especialmente, ao registrar a matança de um porco. A eventual justificativa da abordagem documental não parece, nesse caso, ter força suficiente.



# DE VOLTA À NORMANDIA (RETOUR EN NORMANDIE)

França, 2007

Direção e Roteiro: NICOLAS PHILIBERT

Duração: 113 minutos



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