Críticas


TROPA DE ELITE

De: JOSÉ PADILHA
Com: WAGNER MOURA, CAIO JUNQUEIRA, ANDRÉ RAMIRO
08.10.2007
Por Ricardo Cota
DE WAGNER MOURA A WAGNER MONTES

Convidado a participar de uma comissão selecionadora de projetos da Petrobras, pude conhecer Tropa de Elite muito antes de sua chegada triunfal à Rua da Alfândega. Conheci o filme ainda em seu estado bruto - o roteiro -, o que me permitiu uma visão ainda mais privilegiada do que a da pirataria. Fui, na verdade, um Jack Sparrow original, pirata avant la lettre do aclamado filme de José Padilha. A diferença é que, ao contrário dos outros, não espalhei para ninguém. Até agora.



Já ali, na leitura do roteiro, o melhor e o pior de Tropa de Elite se apresentavam sem destemor. Do melhor, sem dúvida, destacava-se o alto profissionalismo da produção. Bastava constatar o rigor da apresentação do roteiro, com impressionante detalhamento técnico, para perceber um trabalho meticuloso, pronto para ser filmado em seus mínimos detalhes. É provável que haja muitas mudanças, mas mesmo quase dois anos depois de ler o roteiro, a cada seqüência do filme lembrava-me das páginas do material original.



Tamanho profissionalismo só se confirmou nas telas. A interpretação primorosa de Wagner Moura, que por sinal tornou o Nascimento das páginas bem mais crível, a montagem de Daniel Rezende, a fotografia de Lula Carvalho, a direção realista de José Padilha, tudo enfim ratificou o nível de profissionalização do projeto, pavimentando ainda mais o histórico do cinema brasileiro na linhagem dos thrillers sociais.



Mas tamanha virtude técnica no entanto não conseguiu dirimir o que há de mais negativo em Tropa de Elite: a falsa ambigüidade do discurso. Por mais que se queira apresentar como obra aberta, promotora de discussões e reflexões, Tropa de Elite fetichiza sim o Bope, caricaturiza os filhos da classe média e esculacha os baianos da vida. Tudo em nome de uma suposta “visão do policial”, no caso o PM Matias, e não Nascimento. Matias é um policial idealizado, impávido colosso, capaz de domar as rédeas de Foucault com a ética de um Spinoza. Enquanto isso a poliçada exibe as corruptas gavetas de dinheiro, os universitários se alienam com entorpecentes e o lumpesinato cede ao canto de sereia das ONGs.



Em recente carta a um grande jornal do Rio, Wagner Moura destila lucidez ao defender que Tropa de Elite não é um filme fascista. Mas contrapõe ser inadmissível que Nascimento seja visto como herói, o que, segundo outro grande jornal carioca, tem sido comum em brincadeiras de adolescentes na escola. Wagner Moura chega a perguntar-se como reagiria uma platéia sueca à violência explícita do filme. Duvida que os suecos sejam capazes de apoiar Nascimento. É uma boa indagação, sem dúvida. Mas, por ora, o que dá para imaginar, e até mesmo constatar nas ruas, é o bordão do Bope caindo na boca do povo, assim como já caíram bordões criados pelo maior defensor da “visão do policial”, o Deputado Estadual, colunista e apresentador de tevê Wagner Montes. Aquele que grita: “Escraachaaa!!!” e “Pra cima deles, poliçada”. Definitivamente, há mais entre o Brasil de Wagner Moura e o Brasil de Wagner Montes do que supõe Tropa de Elite, filme bem intencionado, porém mal resolvido.



# TROPA DE ELITE

Brasil, 2007

Direção: JOSÉ PADILHA

Roteiro: BRAULIO MANTOVANI, JOSÉ PADILHA E RODRIGO PIMENTEL

Produção: JOSÉ PADILHA E MARCOS PRADO

Fotografia: LULA CARVALHO

Edição: DANIEL REZENDE

Música: PEDRO BROMFMAN

Elenco: WAGNER MOURA, CAIO JUNQUEIRA, ANDRÉ RAMIRO, MILHEM CORTAZ, MARCELO ESCOREL, FERNANDA DE FREITAS, FERNANDA MACHADO

Duração: 118 min.

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