As Madres da Plaza de Mayo têm um grande espaço em Condor. Foi através das relações entre pais e filhos que Roberto Mader encontrou a melhor maneira de falar da Operação Condor, que nos anos 1970 coordenou a ação de ditaduras militares da América do Sul para estender a repressão além-fronteiras. São várias as histórias de crianças seqüestradas, pais separados de filhos por muitos anos, reencontros emocionados e feridas nunca cicatrizadas.
A trilha sonora dolente de Victor Biglione, bonita ainda que pesada, procura sintonizar o espectador com a experiência emocional das vítimas – seja o ex-torturado que revisita o Estádio Nacional de Santiago, seja a mulher que foi apartada do filho quando ele tinha 20 dias de vida e só foi revê-lo 25 anos depois. Há o caso da uruguaia Victoria Larrabeiti, que ajuda a contar como uma família chilena a adotou depois que ela e o irmão, muito pequenos, presenciaram a morte dos pais biológicos e foram deixados numa praça em Valparaíso.
Outras histórias tiveram grande repercussão no Brasil, como a do casal uruguaio Lilian Celiberti e Universindo Diaz. Seqüestrados pela polícia uruguaia em Porto Alegre, eles foram libertados em função de ações jurídicas e de campanha na imprensa brasileira. Lilian reaparece no filme, mais de 30 anos depois, para falar de sua gratidão.
A simples aparição dessas pessoas se contrapõe à política dos “desaparecimentos”, que tanto serviu aos regimes militares da época. A voz e a memória delas desmentem a idéia de que aquela página da História foi virada, como afirma Jarbas Passarinho, um espantoso retórico de ambigüidade quase cínica.
A dinâmica das entrevistas explora as opiniões contrárias de defensores da lógica ditatorial e vítimas da Operação Condor. Um dos grandes trunfos do filme é ter ouvido o nefando chefe da polícia secreta de Pinochet, ex-general Manuel Contreras, primeiro em sua casa – onde exibe sua coleção de facas – e depois na prisão militar em Santiago, aonde foi levado para cumprir pena pelo assassinato do ex-chanceler Orlando Letelier no exílio, em 1976.
Através de atentados, desaparecimentos, prisões no exterior e seqüestro de crianças, a operação lançava tentáculos como um polvo. No filme, a edição de Célia Freitas e o corte final de Ricardo Miranda como que reproduzem essa característica tentacular, a ponto de ser às vezes difícil assimilar todos os eixos narrativos que se referem a Chile, Argentina, Brasil e Uruguai. Tão portentoso é o volume de informações que chega a ser admirável o tour de force para organizá-las.
No entanto, para quem espera grandes revelações sobre o funcionamento mesmo da Operação Condor, Roberto Mader não parece ter muito a oferecer. Em certa medida, Condor é mais propriamente um relato resumido e articulado dos golpes militares e dos períodos ditatoriais nos quatro países, e ainda da forma como cada um o superou. Nesse sentido, um dos materiais mais impressionantes são as filmagens da TV alemã ZDF no campo de prisioneiros de Pisagua, no Chile, onde muitos morreram depois de serem obrigados a marchar cantando hinos militares. A visão daquele lugar, com sua arquitetura sinistra inspirada em Auschwitz, evoca todo o horror de uma época.
Condor ganhou o Troféu Redentor de melhor doc no Festival do Rio, o Prêmio Especial do Júri e um prêmio para a trilha sonora no Festival de Gramado.
CONDOR
Brasil, 2007
Direção, produção e roteiro: ROBERTO MADER
Fotografia: GUY GONÇALVES
Edição: CÉLIA FREITAS, RICARDO MIRANDA
Música: VICTOR BIGLIONE
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