Nome Próprio parece ser um filme norteado por uma espécie de desejo expresso em fazer com que o espectador enxergue Camila por dentro. Num certo sentido, tudo remete à interioridade da personagem, criada a partir de textos da escritora e blogueira Clarah Averbuck e interpretada com visível dose de entrega por Leandra Leal: diversas ações (raspar a unha, descartar comprimidos de uma cartela, aderir à faxina de modo maníaco), repletas de ruídos devidamente potencializados, “informam” sobre o seu estado psíquico.
Mas o diretor Murilo Salles também lembra que a interioridade esbarra numa impossibilidade. A câmera busca tanto o close que, em determinados instantes, a precisão da imagem se perde. É como se não existisse nada dentro de Camila. Sua interioridade encontra-se, isto sim, estampada no próprio corpo.
Até porque olhar para fora é olhar para dentro, a exemplo da passagem na qual Camila surge observando a área interna do edifício onde está hospedada. O cineasta investe num filme de espaços fechados e, não por acaso, valoriza os abertos, desenvolvendo uma equação já posta em prática em Nunca fomos tão Felizes .
Como se pode ver, as instâncias de interioridade e exterioridade não são necessariamente opostas. O contraste só se evidencia na alternância entre uma Camila que age como uma espécie de fratura exposta e a “presença” da narradora, que escreve sobre Camila a partir de uma perspectiva distanciada, utilizando verbos no passado ou no futuro. O que está em questão não é o fato de a personagem fazer exatamente o que a narradora anuncia e sim a espessura formada entre o viver e o narrar, entre a fala em primeira e em terceira pessoa.
Assim, não há propriamente reiteração nos recursos empregados em Nome Próprio . A câmera de Murilo Salles traz à tona a desestabilização de Camila; contudo, é mais suave que a personagem, não se constituindo, portanto, como mera ilustração do seu instante emocional.
Também não ocorre reiteração quando Camila murmura aquilo que escreve, na medida em que traz à tona a perspectiva da arte como expressão de uma pessoalidade, como resposta ao modo como o mundo incide sobre si. Em momentos como estes, o público é levado a experimentar a posição de leitor. Por meio deste acúmulo de “funções”, Murilo Salles lembra que a apreciação de um trabalho nunca é integral. Afinal, mesmo quando não há acúmulos ou escolhas a serem feitas, cada espectador se apropria do que assiste de um modo diverso.
NOME PRÓPRIO
Brasil, 2008
Direção: MURILO SALLES
Roteiro: ELENA SOAREZ, MELANIE DIMANTAS, MURILO SALLES
Redação e edição final dos textos: VIVIANE MOSÉ
Fotografia: MURILO SALLES, FERNANDA RISCALI
Edição: VÂNIA DEBS
Música: SACHA AMBAK
Direção de arte: PEDRO PAULO SOUZA
Edição de som: VIRGÍNIA FLORES
Elenco: LEANDRA LEAL, JULIANO CAZARRÉ, RICARDO GARCIA, ROSANNE MULHOLLAND, DAVID KATZ
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