Críticas


CASTELAR E NELSON DANTAS NO PAÍS DOS GENERAIS

De: CARLOS ALBERTO PRATES CORREIA
Com: RAFAELA AMADO, PRISCILA ASSUM, TAVINHO MOURA
27.10.2008
Por Carlos Alberto Mattos
CENAS ÍNTIMAS DO CINEMA EM MINAS

O que esperar de um documentário assinado por Carlos Alberto Prates Correia? Quem conhece a obra ficcional desse mineiro de Montes Claros sabe o que esperar: irreverência, humor sardônico, poesia surrealista, ausência de linearidade. É o que se via em filmes como Cabaret Mineiro, Noites do Sertão (dois dos melhores filmes brasileiros dos anos 1980), Crioulo Doido, Minas Texas etc. Prates é um poeta-entomologista da mineiridade, dono de prosódia safadinha, que vai do chulo ao sublime sem deixar cair uma gota.



Tudo isso pode ser encontrado em Castelar e Nelson Dantas no País dos Generais, premiado como melhor longa brasileiro e melhor montagem em Gramado e vencedor do Prêmio do Júri no Festival de Paulínia. A proposta de Prates não é exatamente contar a história do cinema mineiro durante os anos da ditadura militar, mas fazer um ensaio sobre o fator Minas no cinema do período. Isso tudo segundo suas idiossincrasias, e tendo a própria obra – merecidamente – como eixo principal. Daí não vermos cenas, por exemplo, de filmes dos ativos irmãos Santos Pereira, nem mesmo de obras singulares como Idolatrada, de Paulo Augusto Gomes, Um Filme 100% Brasileiro, de José Sette de Barros, ou O Anunciador – O Homem das Tormentas, de Paulo Bastos Martins.



Quando deixa o próprio umbigo de lado, Prates dedica-se sobretudo a louvar a trajetória curta e marginal de Schubert Magalhães, a aventura criadora do crítico Maurício Gomes Leite (A Vida Provisória), a estréia de Alberto Graça com Memórias do Medo e as passagens de Andrea Tonacci (Bang-Bang) e Joaquim Pedro de Andrade (O Padre e a Moça, O Aleijadinho, Os Inconfidentes) pelos cenários de Minas. Algumas perguntas ficam pairando no ar: o que muda num cineasta de outro estado quando ele filma em Minas? De que maneira a procedência ou a ambientação de uma produção se imprime no filme que se vê na tela?



Mas ninguém está lá para responder a essas coisas. Qualquer intenção minimamente expositiva é logo sabotada pela verve iconoclasta do diretor. Até as citações de textos críticos são retemperadas por declamações. A montagem do próprio Prates nos conduz por um labirinto de falsas continuidades, aproximações poéticas, interrupções e intermitências. Mais que explicar, o objetivo é passear por um acervo sem traços comuns visíveis a não ser uma suposta mineiridade. No caminho, a narração solta farpas contra o Cinema Novo (fala-se em “gigolética da fome”) e a Embrafilme. O caráter independente, melhor dizendo solitário, da obra de Prates justifica esse olhar enviesado e constitui sua marca autoral.



O Castelar do título é o próprio diretor e narrador. Assim como “JHP” é o ex-crítico José Haroldo Pereira. Mas quem serão Noeme, Burt, Miltão e outros nomes citados com freqüência? Ninguém está lá para responder. O apego à charada e ao pseudônimo é parte do que faz de Castelar e Nelson Dantas uma peça bastante cifrada para quem não domina seu repertório. De alguma maneira, isso é característico de um traço mineiro, que toma o doméstico como coisa universal e pressupõe que todos entendam referências muito particulares.



É um prazer visitar ou revisitar o cinema estimulante de Prates Correia, assim como os clipes de tantos outros filmes, memoráveis ou não. Mas boa parcela do potencial de comunicação desse tesouro mineiro se perde no discurso experimental imposto ao conjunto. Muita gente vai gostar, sim senhor, mas outro tanto vai ficar boiando, uai.



Visite o DocBlog do crítico.



CASTELAR E NELSON DANTAS NO PAÍS DOS GENERAIS

Brasil, 2007

Direção, roteiro, produção e montagem:
CARLOS ALBERTO PRATES CORREIA

Fotografia: DIB LUTFI

Som e edição sonora: WALTER GOULART, NILTON FERRARO

Elenco: RAFAELA AMADO, PRISCILA ASSUM, TAVINHO MOURA, ANDREA DANTAS, REGINA COELHO, LINA DE CARLO, LEILANY FERNANDES

Duração: 73 minutos

Site oficial: clique aqui

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