Verônica , novo filme de Maurício Farias, integra uma vertente do cinema nacional dos últimos anos que confronta o espectador com um choque de realidade (ao destacar o aumento da violência nas grandes cidades) e, ao mesmo tempo, flerta com as ferramentas do thriller. Cidade de Deus , de Fernando Meirelles, é o exemplar mais famoso e bem-acabado desta tendência, mas pode-se citar ainda Meu Nome não é Johnny (que flerta com o humor), Era uma Vez... (que investe num Romeu e Julieta na cidade partida, em abordagem repleta de clichês) e Última Parada 174 (que contrasta o “baseado em fatos reais” com uma trama notadamente novelesca).
Maurício Farias procura conciliar o retrato da impunidade com o desejo de entreter. Esforça-se para extrair boa dose de tensão da história de uma professora, a Verônica do título, que passa a proteger um aluno, o pequeno Leandro, que teve os pais eliminados por traficantes. A seqüência em que o diretor maneja o suspense de maneira mais habilidosa é a que Verônica e Leandro procuram escapar silenciosamente de policiais/bandidos pelas escadas do prédio. A postura ambígua de Paulo, ex-namorado da heroína, também é utilizada para suscitar expectativas na platéia. O resultado, competente, não chega a ser prejudicado por um ou outro excesso na trilha sonora (realçando a ação) e na fotografia (o uso da textura granulada no instante em que Verônica é informada de que o menino está jurado de morte).
Através do imprevisto contato com Leandro, Verônica dá partida a um processo de retomada da afetividade que lembra a jornada da Dora de Central do Brasil , de Walter Salles, apesar de a personagem interpretada com vigor por Andréa Beltrão não ser tão fim de linha como a de Fernanda Montenegro. O fato é que Farias não dialoga “apenas” com Gloria , de John Cassavetes, seu correspondente mais imediato. Há, na cena final, até uma referência à Antígona , tragédia de Sófocles em que a protagonista reage contra a proibição de enterrar o irmão, por meio de uma pergunta lançada por Verônica: “que lei é essa que impede um filho de enterrar seus pais assassinados?”
# VERÔNICA
Brasil, 2008
Direção: MAURÍCIO FARIAS
Roteiro: BERNARDO GUILHERME, MAURÍCIO FARIAS
Produção: SILVIA FRAIHA
Fotografia: JOSÉ GUERRA
Trilha Sonora: BRANCO MELLO, EMERSON VILLANI
Montagem: FABIO VILLELA
Elenco: ANDRÉA BELTRÃO, MARCO RICCA, MATHEUS DE SÁ
Duração: 90 minutos