Críticas


FESTIVAL DO RIO 2009: MOSTRA EXPECTATIVA

De: VÁRIOS DIRETORES
Com: VÁRIOS INTERPRÉTES
01.10.2009
Por Críticos.com.br
MOSTRA EXPECTATIVA - Festival do Rio 2009

UM OUTRO HOMEM



Direção: Lionel Baier



por Luiz Fernando Gallego em 07/10/2009



A premissa é interessante, especialmente para cinéfilos: ‘François’ muda-se para um lugarejo na Suíça por conta do emprego da namorada que é professora. Consegue trabalho como jornalista em uma publicação local cujo responsável se diz “gráfico” e não “editor”. Apesar de sua formação ser em francês medieval, ele terá que fazer de tudo para o jornalzinho, inclusive críticas de filmes, coisa que seu antecessor no cargo fazia muito bem... aos olhos da proprietária da sala de cinema local. A linguagem do falecido crítico na verdade era bisonha, mas agradava ao gosto do público da região – e à exibidora - assim como ao não-editor (gráfico). Um sucesso regional.



François não conseguiria reproduzir as sandices melosas do outro e, sem ter nenhuma ligação com cinema autoral, acaba copiando trechos inteiros de críticas de uma revista especializada com o jargão verborrágico, pretensioso e críptico como os de tantos textos sobre artes em geral, não só sobre cinema. Mas não dá para não pensar nos Cahiers e em seus imitadores.



Pena que o desenvolvimento do roteiro não seja tão satisfatório a partir do momento em que François fica atraído por ‘Rosa’ – que escreve sobre cinema em um jornal muito mais importante. Há cenas lamentáveis de intimidade pós-coito enquanto comem pratos orientais com os famosos “pauzinhos” aos quais nem todos se acostumam. Nada escatológico, mas gratuito, permitindo uma piada (à brasileira) com o termo “pauzinhos” e o que Rosa faz com eles e com o dito cujo de François.



A questão do plágio em jornalismo cultural e o questionamento sobre os que “sabem” e os que “não sabem” escrever sobre filmes pode sustentar algum interesse, assim como a funcional fotografia em preto-e-branco e a ótima composição dos atores: a menos simpática Rosa é defendida sem pudores por Natacha Koutchoumov, e o quase patético ‘François’ vai sendo levado adiante com competente seriedade (que acaba sugerindo ironia) por Robin Harsch, um ator em quem se deve prestar atenção, asim como ao diretor Lionel Baier. Mas filmes suiços por aqui... só em festivais mesmo.



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O AMOR ESCONDIDO (L´Amour caché)



Direção: Alessandro Capone



por Luiz Fernando Gallego em 03/10/2009



Talvez a intenção deste filme seja a de discutir o “amor materno” entre os humanos: trata-se de algo culturalmente adquirido ou é instintivamente determinado? Se nossa crença recai nesta segunda hipótese, a personagem interpretada por Isabelle Huppert em O Amor Escondido seria desviante, uma doente, uma mostruosidade, talvez. No entanto, se consideraramos a outra teoria, a culpa sentida por esta mulher que não consegue amar sua cria é que faz dela uma vítima de preconceito cultural: uma obrigatoriedade que não seria universal como se quer acreditar.



Mas o roteiro, baseado em romance de Danièle Girard, mostra-se repetitivo e mal desenvolvido, resultando em um filme cansativo e sem ritmo. O uso de imagens em preto-e-branco (para o tempo passado) alternando-se com cenas a cores é uma formatação no mínimo ingênua e dispensável, por mais que o fotógrafo seja Luciano Tavoli (de Profissão:Repórter, de Antonioni, dentre outros muitos trabalhos exemplares para grandes cineastas).



Nem mesmo a habitual entrega visceral de Isabelle Huppert à personagem é suficiente para resgatar o filme, cabendo à Gretta Scacchi o ingrato papel de uma psiquiatra perdida no confronto com sua paciente, não sendo possível deixar de questionar a incompetência das tentativas picoterápicas (?) da tal doutora, absolutamente carentes de qualquer teoria que embase sua... técnica (?). Como se não bastasse, há um discurso proselitista sobre os hábitos dos diversos animais no cuidado com os filhos...



No final das contas, a mãe que não ama sua filha permanece como uma esfinge mal-decifrada: trata-se de uma esquizóide? de uma borderline? ou de uma mulher que sofre pela culpa moral avinda de uma premissa de nossa sociedade que não deveria ser norma? A precariedade no desenvolvimento psicológico da personagem chega a uma cena final totalmente fake - aliás, como todo este filme.



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27 CENAS SOBRE JORGEN LETH



Direção: Amir Labaki



por Carlos Alberto Mattos em 25/09/2009



Eis o que eu chamo de uma oportunidade bem aproveitada. Por ocasião da vinda de Jorgen Leth ao Brasil, para o É Tudo Verdade de 2008, Amir Labaki gravou debates e depoimentos do grande documentarista e poeta dinamarquês. Esse é o material de base para uma eficaz introdução aos temas e métodos de Leth.



O formato de módulos isolados (como no clássico sobre Glenn Gould) se presta adequadamente não só às intenções do filme, como a evocar o gosto de Leth pelos tableaux (vide The Perfect Human e 66 Scenes From America). Alternam-se falas diretas para a câmera, trechos de conferências, poemas na tela, fotografias, quadros e cenas de filmes que exemplificam a vanguarda em documentário.



De maneira simples, mas com um roteiro de edição inteligente, Labaki consegue articular os interesses de Leth por poesia, antropologia, viagens, esportes, erotismo e cinema. O caráter multidisciplinar do seu trabalho ajuda a fazer desse pequeno doc um passeio saboroso pelo pensamento transformado em arte.



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A PROCURA DE PAZ (Pokoj v Dusi)



Direção: Vladimír Balko



Por Leonardo Luiz Ferreira em 24/9/2009



O filme eslovaco tem pretensões artísticas com seus planos gerais de paisagem e a fotografia límpida. Entretanto, em sua essência, é um folhetim mexicano piorado e nunca assumido. É como se entregassem o material de uma novela latina para um diretor europeu, e o resultado é a ausência de assinatura em uma obra que se torna um híbrido entre dramas do Leste Europeu, com suas cidades interioranas repletas de estereótipos, e um filme B sobre traição e moral, com uma realização de alguém que não compreende nada sobre como costurar os elementos de uma narrativa.



O roteiro já apresenta todos os lugares-comuns possíveis em suas linhas gerais: homem sai da cadeia em busca de recomeçar a vida, mas só encontra preconceito e portas fechadas em sua comunidade. Isso já bastava para imaginar uma trama medíocre, só que o diretor Balko despreza o seu personagem principal e coloca inúmeras intempéries na vida desse trabalhador do campo. Os problemas são tantos que há até uma cena, próxima do fim, em que o próprio ironiza a sua condição de desempregado, ex-prisioneiro, traído pela mulher, com um filho bastardo, endividado e com uma hipoplasia nos testículos. Essa é a forma do diretor eslovaco, que estreia na direção de longas ficcionais com A Procura de Paz, de demonstrar que estudou direito os manuais de direção e seguir à risca o péssimo roteiro de Jirí Krizan.



O que sobra ao desfecho é um longo movimento de grua pela floresta e nos belos campos em direção ao céu: uma metáfora sobre morte tão pobre quanto todo o desenvolvimento narrativo.



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EU MATEI MINHA MÃE ( J’ai tué ma mère)



Direção: Xavier Dolan



por Luiz Fernando Gallego em 24/09/2009



Hubert, 16 anos, surge nas telas como um reclamão histérico, gritão e autocentrado. Suas queixas se dirigem quase que exclusivamente à mãe com quem mora e que ele diz odiar. No decorrer do filme, ela vai se mostrar bem pouco hábil em lidar com um adolescente tão “aborrecente” e com particularidades que o tornam mais “difícil” ainda. Mas ele mesmo comenta que seus colegas de mesma idade acham as mães chatas, mas nenhum odeia tanto a mãe como ele – que a culpa de tudo e de mais alguma coisa.



Apesar de ser quase simplória no modo de lidar com Hubert e de ter características de mediocridade e cafonice que o irritam (de modo exacerbado), também vai ficando claro que ela se esforçou dentro de suas limitações, privilegiando a “correção” e dedicação pragmática para suprir as necessidades materiais de uma dupla mãe-e-filho sem pai participante (deixou a família quando o garoto tinha 4 anos).



Em algum momento o rapazola vai dizer que é impossível amá-la e é impossível deixar de amá-la. A ambivalência adolescente, mesclando rompantes de fúria com tentativas de aproximação, é bem representada na construção do personagem. Embora a narrativa cinematográfica oscile entre o rotineiro e alguns tiques espertinhos, típicos de primeiro filme, o roteiro equilibra razoavelmente as razões de cada um em relação às falhas do outro. Tentando pinceladas de algum humor entremeando cenas rapidíssimas que comentam a ação ou refletem a visão de Hubert (algumas questionáveis), o filme consegue um retrato bem verossímil de situações familiares em que todos têm razão e – claro que - ninguém tem (toda) a razão (como cada um crê). O que predomina é a incompreensão solipsista.



No cômputo geral, o filme não consegue evitar a impressão de ser especialmente interessante para terapeutas de família, quase uma “case story” - ainda que deva ser louvada a ausência de maniqueísmo e de soluções fáceis no desenvolvimento da história. Os atores Anne Dorval (a mãe) e o próprio diretor-roteirista Xavier Dolan (20 anos passando muito bem pelos 16 do personagem) ajudam bastante por não caírem na caricatura fácil, evitando que seus personagens virem “tipos” sem nenhuma complexidade.

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