Críticas


DISTRITO 9

De: NEILL BLOMKAMP
Com: SHARLTO COPLEY, DAVID JAMES, VANESSA HAYWOOD
26.10.2009
Por Marcelo Janot
MUITO ACIMA DA MÉDIA

Dá pra imaginar como se sentem os executivos dos grandes estúdios hollywoodianos quando, depois de torrarem bilhões de dólares anuais com repetitivas variações da mesma fórmula, vêem surgir um filme como a produção sul-africana Distrito 9. Com um roteiro inteligente e original, verba suficiente para convincentes efeitos especiais e um diretor talentoso com liberdade para fazer o filme da maneira que acha melhor, o resultado não poderia ser outro: Distrito 9 é sensacional, um sopro de criatividade e renovação no combalido filão de filmes de ação.



Quando pensamos que os americanos gastaram 200 milhões de dólares para insistir em mais um Exterminador do Futuro e morreram num prejuízo grande, constatamos como uma boa idéia não tem preço. Bastaram o equivalente a US$ 30 milhões para que Distrito 9 pudesse ser realizado e arrecadasse quatro vezes mais apenas nos Estados Unidos.



Foi o hoje milionário neozelandês Peter Jackson, diretor de O Senhor dos Anéis, quem vislumbrou potencial no jovem diretor sul-africano Neill Blomkamp e resolveu produzir o filme. Blomkamp nunca tinha dirigido um longa, mas um curta sobre o mesmo assunto realizado em 2005 e uma certa experiência com produção de efeitos visuais o credenciavam como uma boa aposta. Que se confirma desde o início, quando somos arremessados no universo caótico de Joannesburgo, em que a convivência entre os sul-africanos e os alienígenas que por lá aportaram 20 anos atrás se tornou insuportável. A solução para remediar o conflito é remover os alienígenas do gueto em que se encontram, o Distrito 9, para outro mais isolado, parecido com um campo de concentração.



A apresentação daquele panorama é feita no formato de um docudrama, relatando, através de depoimentos para um suposto documentário, a situação dos principais envolvidos no trágico episódio da tentativa de remoção. Uma vez que o espectador já está situado, a ação passa a transcorrer cronologicamente, num ritmo tão intenso e envolvente que não é difícil perceber que estamos diante de um novo talento da direção.



O impacto não seria o mesmo se Blomkamp (que também é co-autor do roteiro) não mostrasse que, além da destreza técnica, também tem algo a dizer. E não se trata de um discurso velho e confortável contra o apartheid. Quem esteve na África do Sul recentemente ou conhece minimamente a atual situação do país vai perceber que a crítica social levantada pelo filme é atualíssima, corajosa e bastante verossímil. Por mais que o fim do apartheid tenha ocorrido no século passado, alguns dias a passeio por Joannesburgo são suficientes para notar uma tensão constante e uma guetificação natural no convívio entre negros e brancos. Nas regiões mais pobres, há ainda a séria questão da violência com que são tratados, pelos próprios negros, os imigrantes vindo de regiões miseráveis de outros países da África, o que explica a presença dos vilões nigerianos no filme.



A concepção dos alienígenas é outro destaque do filme. O visual repugnante (são chamados pejorativamente de “camarões” pelos opressores) não parece querer despertar no espectador sentimentos quaisquer, seja de asco, raiva ou compaixão. Eles se comunicam numa língua cuja pronúncia faz lembrar o dialeto zulu, e a identificação emocional se dá apenas pela caracterização psicológica e mais próxima do que conhecemos como humanizada do alien Christopher Johnson e seu filho.



Não se trata de uma obra perfeita. Alguns personagens esbarram na caricatura e certos detalhes são inverossímeis, mas nada que atrapalhe o conjunto final de um dos poucos filmes recentes que nos fazem sair do cinema com a sensação de termos visto surgir um novo talento. Neill Blomkamp: vale a pena guardar esse nome antes que ele seja abduzido como um alienígena pelos magnatas de Hollywood.





DISTRITO 9 (DISTRICT 9)

EUA, 2009

Direção: NEILL BLOMKAMP

Roteiro: NEILL BLOMKAMP, TERRI TATCHELL

Fotografia: TRENT OPALOCH

Montagem: JULIAN CLARKE

Música: CLINTON SHORTER

Elenco: SHARLTO COPLEY, DAVID JAMES, VANESSA HAYWOOD

Duração: 112 minutos

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