A fogueira das virtualidades arde em A Rede Social. A história da criação do Facebook é um desses fenômenos típicos dos tempos de desmaterialização em que vivemos. O filme nos mostra, quase didaticamente, como o nada pode crescer a ponto de se transformar em negócio bilionário, sem que nenhum bem material seja criado, nenhum anúncio seja contratado, ninguém compre nem venda absolutamente nada. O que se oferece são contatos, relações, promessas de conexão fácil, rápida e gratuita.
Nos anos 1980, Wall Street já havia explorado essa desmaterialização através do mercado financeiro, onde também se joga com virtualidades. Embora o real Mark Zuckerberg não se compare em vilania ao fictício Gordon Gekko, vejo A Rede Social como uma espécie de sucessor do filme de Oliver Stone pela forma como expõe o jogo dos empreendimentos, com seu estoque de espertezas, rasteiras e impiedade.
O filme de David Fincher, muito oportunamente, é outro exemplo de “criação a partir do nada”. Sim, porque a gênese do Facebook está longe de ser um épico ou uma comédia irresistível. Como, então, transformar um monte de garotos falando sem parar e masturbando notebooks num filme de sucesso e provável vencedor de alguns Oscars? Ora, hiperconstruindo essa história com o uso de várias fórmulas consagradas pelo cinema americano.
Do ponto de vista de Mark, The Social Network é uma success story, mais uma mente brilhante que sabe reconhecer as oportunidades e manter-se fiel a um sonho. Pelo ângulo da dupla que ele forma com (o brasileiro-americano) Eduardo Saverin, é um buddy movie, em que não falta a costumeira sucessão de cumplicidade e rivalidade. Na perspectiva de suas disputas com os irmãos Winklevoss, é uma sitcom na medida para demarcar a simpatia da plateia. Se considerarmos que a maior parte do filme são relatos a partir de uma audiência, temos a dramaturgia clássica do filme de tribunal.
Como uma corrente subterrânea, da primeira à última cena, flui outra referência importante: Cidadão Kane. Mark Zuckerberg é caracterizado, até onde o contexto permite, como um herói trágico. Assim como Kane teria construído seu império e acumulado poder sem nunca ter conseguido de fato suprir uma perda da infância, Mark também tem o seu rosebud – e cabe ao espectador descobri-lo.
A REDE SOCIAL (THE SOCIAL NETWORK)
Direção: DAVID FINCHER
Roteiro: AARON SORKIN, a partir do livro de BEN MEZRICH
Fotografia: JEFF CRONENWETH
Montagem: KIRK BAXTER, ANGUS WALL
Música: TRENT REZNOR, ATTICUS ROSS
Elenco: MARK ZUCKERBERG, ANDREW GARFIELD, ARMIE HAMMER, JUSTIN TIMBERLAKE
Duração: 120 minutos
Site oficial: clique aqui