Críticas


CISNE NEGRO

De: DARREN ARONOFSKY
Com: NATALIE PORTMAN, VINCENT CASSEL, MILA KUNIS
04.02.2011
Por Marcelo Janot
DE ASAS E OLHOS BEM ABERTOS

Faz parte do ofício do crítico situar o filme historicamente, relembrando parentescos temáticos e estéticos com outras obras cinematográficas. Uma rápida olhada em sites como o metacritic.com, que costuma compilar as críticas publicadas nos Estados Unidos a respeito de determinado filme, pode nos deixar com a impressão de que Cisne Negro é uma mera reciclagem de idéias já utlizadas. Sapatinhos Vermelhos, A Malvada, Carrie, A Estranha, Nasce Uma Estrela e até Showgirls são apenas alguns dos filmes que teriam parentesco com Cisne Negro ou servido de inspiração para Darren Aronofsky e seu trio de roteiristas. Mas a maioria avassaladora das críticas é positiva, com elogios quase unânimes, o que mostra que não há problema algum em retrabalhar certas idéias, desde que a forma seja apropriada.



Curioso não ter encontrado, em nenhuma das críticas lidas ou em entrevistas dos realizadores, uma única menção a De Olhos Bem Fechados, de Stanley Kubrick. O parentesco com a obra derradeira do maior cineasta americano foi o que mais me chamou a atenção no filme, e talvez o que mais me tenha feito apreciá-lo. Se lida apenas como a história de uma talentosa bailarina que precisa ver seu lado “ cisne negro” aflorar para conquistar um papel de destaque, tendo que enfrentar uma concorrente na companhia, a sinopse do filme de Aronofsky pode soar banal, assim cmo a história de um jovem milionário novaiorquino atrás de uma noite de aventuras para se livrar do tédio de seu casamento, vista em De Olhos Bem Fechados.



A odisséia existencial de Bill, o personagem de Tom Cruise, é muito semelhante à enfrentada pela Nina encarnada com brilhantismo por Natalie Portman em Cisne Negro. Cada um com suas particularidades, ambos questionam internamente os modelos de perfeição e felicidade que a sociedade lhes impôs. Em sua viagem errática por bares, lojas de fantasias e orgias secretas, Bill parece vagar por um universo completamente estranho e diferente da Nova York do seu dia a dia. O mesmo se aplica a Nina, a jovem reclusa em nome da disciplina espartana do balé e da paranóia da mãe, uma bailarina que abriu mão de sua carreira por conta da maternidade (idéia reciclada de Momento de Decisão, de Herbert Ross).



Os fantasmas que assombram Nina assustam e seduzem, encontrando eco nos participantes mascarados da orgia onde Bill vai parar. As duas trajetórias desembocam no final catártico e libertador para cada personagem. Os mundos criados por Kubrick e Aronofsky correm em paralelo, encontrando o ponto de interseção no fato de criarem uma atmosfera singular para seus filmes, cada qual a seu modo. Em Kubrick, o minimalismo e o rigor absoluto nos enquadramentos, na música, na ambientação. Em Aronofsky, a grandiloqüência despudorada, o banho de sangue, o frenesi da câmera que funga no cangote da personagem como se lhe impusesse as doloridas e necessárias chagas negras.



Em uma cena-chave de Cisne Negro, o diretor da companhia, vivido por Vincent Cassel, aconselha Nina a liberar seu impulso destrutivo e a buscar a imperfeição para melhor poder encarnar a personagem do cisne negro no balé. É um conselho que o diretor leva ao pé da letra. As imperfeições sublinham a visceralidade de Cisne Negro, e se por um lado incomodam seus detratores, por outro o transformam em uma experiência fascinante para os que forem absorvidos por aquele universo.



CISNE NEGRO (BLACK SWAN)

EUA, 2010

Direção:
DARREN ARONOFSKY

Roteiro: MARK HEYMAN, ANDRES HEINZ, JOHN J. MCLAUGHLIN

Fotografia: MATTHEW LIBATIQUE

Montagem: ANDREW WEISBLUM

Música: CLINT MANSELL, TCHAIKOVSKY

Direção de arte: DAVID STEIN

Figurinos: AMY WESTCOTT

Elenco: NATALIE PORTMAN, VINCENT CASSEL, MILA KUNIS, BARABARA HERSHEY, WINONA RYDER

Duração: 108 minutos

Site oficial: clique aqui

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