Alguns filmes lançados recentemente no circuito comercial têm revelado um contraste entre excelentes trabalhos de atores e roteiros um tanto esquemáticos. É o caso de Biutiful , de Alejandro González Iñarritu, em que as ótimas interpretações de Javier Bardem e Maricel Álvarez voam bem acima do previsível arco dramático do protagonista. E também de A Última Estação , de Michael Hoffman, produção do ano passado que desembarcou tardiamente nos cinemas brasileiros, potencializada pelos desempenhos de Helen Mirren e Christopher Plummer. Situação semelhante ocorre em O Discurso do Rei , filme de Tom Hooper, favorito na corrida ao Oscar (12 indicações). Colin Firth está irrepreensível. Já o roteiro (de David Seidler) não evita a previsibilidade.
Na pele de Albert/rei George VI, à beira de se dar por vencido na luta contra a gagueira, problema que praticamente inviabiliza sua performance em público, Firth apresenta uma composição minuciosa, na qual sobressai o constrangimento diante do esforço para falar, a irritação frente à dificuldade em não interromper as frases no meio, a personalidade retraída e as breves explosões de fúria. Felizmente, ele encontra, com a providencial ajuda da mulher, Elizabeth (Helena Bonham Carter), Lionel Logue (Geoffrey Rush), fonoaudiólogo não diplomado que gosta de recitar Shakespeare (menções às tragédias Hamlet e Ricardo III e a um texto de natureza diversa, A Tempestade ).
Com exceção de Colin Firth, em oportuna contracena com os competentes Rush e Bonham Carter, quase tudo bate na tela conforme o esperado, principalmente no que diz respeito à relação travada entre o (futuro) rei e Logue. Fica claro desde o início que ambos se tornarão cúmplices a partir do momento em que as defesas do arredio Albert/George VI começarem a cair por terra. E antes mesmo de Logue diagnosticar, o espectador prevê que as causas da gagueira repousam sobre traumas familiares, o que gera reação e posterior compreensão do protagonista. O instante da superação – e a Academia gosta deles, a julgar pela indicação de O Vencedor , de David O. Russel – tarda, mas não falha. Surge sintetizado no título: o ansiado discurso do rei, devidamente orquestrado por Lionel Logue.
Texto publicado no Jornal do Brasil em 11 de fevereiro de 2011
# O DISCURSO DO REI (THE KING´S SPEECH)
Reino Unido/Austrália, 2010
Direção: TOM HOOPER
Roteiro: DAVID SEIDLER
Produção: IAIN CANNING, EMILE SHERMAN, GARETH UNWIN
Trilha Sonora: ALEXANDRE DESPLAT
Fotografia: DANNY COHEN
Montagem: TARIQ ANWAR
Direção de Arte: NETTY CHAPMAN
Elenco: COLIN FIRTH, GEOFFREY RUSH, HELENA BONHAM CARTER
Duração: 118 minutos