Críticas


REENCONTRANDO A FELICIDADE

De: JOHN CAMNERON MITCHELL
Com: NICOLE KIDMAN, AARON ECKHART, DIANNE WIEST, MILES TELLER
03.05.2011
Por Luiz Fernando Gallego
TENTATIVAS PARA ELABORAR UM LUTO

O absurdo título brasileiro de Rabbit Hole passa a idéia de que o filme vai mostrar um casal - duramente atingido pela morte de um filho de 4 anos – “reencontrando a felicidade”, quando o que o espectador acompanha são vários momentos sucessivos do luto daqueles pais já aos oito meses de perda tão dramática .



A impressão que fica é que o roteiro de David Lindsay-Abaire, baseado em peça de sua autoria (e premiada com o Pulitzer), segue a mesma dramaturgia expositiva naturalista de rotina comum no teatro norteamericano, enfocando diversas tentativas do casal, em conjunto ou não, para lidar com a dor. Neste enfoque, o roteiro se revela quase “didático” por enumerar tantas tentativas-e-erros de seus personagens: eles freqüentam um grupo de pessoas com dramas idênticos; a mãe preferiria evitar algumas coisas que lembrem o filho, enquanto o pai fica vendo, todas as noites, um video do menino em seu celular; a mãe preferiria vender a casa e espera que uma amiga a procure por solidariedade - já o pai continua a se relacionar com seu amigo, marido da mulher que não consegue estar com a mãe enlutada; a mãe não quer em casa o cachorro que o filho perseguia quando foi atropelado, mas o pai preferia que o cão permanecesse com eles; o marido procura a esposa sexualmente, mas ela não consegue estar disponível para tanto; ela procura conversar com o rapaz que dirigia o carro para a frente do qual o menino correu inadvertidamente - sem contar isso ao marido... e ele começa uma paquera com uma outra mulher do grupo de ajuda mútua...



Ao descrever tantos processos tortuosos de enfrentamento da perda, com atitudes tomadas e posteriormente modificadas, acaba sendo bem interessante o fato do roteiro encarar as dores individuais como algo pessoal e intransferível sem pretender oferecer uma receita do tipo “o modo certo de vencer a dor de uma perda” - além de não escorregar para o melodrama. O pathos fica por conta da tragicidade da situação em si mesma e do desempenho exemplar, sem histrionismo - mas podendo atingir alta voltagem emocional - por parte dos atores centrais, Nicole Kidman (talvez o mais virtuosístico desempenho das atrizes indicadas ao Oscar deste ano) e Aaron Eckhart - que merece maior reconhecimento. Também estão bem Miles Teller - como o soturno rapaz que dirigia o carro que atropelou a criança - e Dianne Wiest que faz a ‘mãe’ de Nicole - e que também perdeu um filho, ainda que em situação bastante diversa – sendo um gancho interessante do roteiro o fato da personagem de Nicole Kidman rejeitar a comparação da dor de sua mãe com a sua própria dor até o momento em que a outra diz: “mas ele também era meu filho”. Outras situações, como a da gravidez da irmã, soam como que inseridas artificialmente para o tema que se quer discutir, sendo que a cena de Nicole Kidman no supermercado é gratuita e - não fosse a atriz - poderia ficar ridícula como "demonstração" das fragilidades no sistema defensivo da personagem.



Se a direção e o roteiro evitam aproximações com fórmulas de auto-ajuda (inclusive através do questionamento do grupo e do consolo na religião que vários pais de filhos mortos tentam encontrar), o título original (“toca do coelho”) alude a universos paralelos que não deixariam de ser um modo de encontrar consolo para perda tão visceral como a de um filho neste nosso universo conhecido. Mas se o título relativo a este gancho forçado do enredo pesa um pouco, quem pode atirar alguma pedra em formas de consolação que ajudem a lidar com a dor de perdas tão intensas e sofridas?



No entanto, é difícil não lembrar que A Liberdade é Azul, de Kieslovski assim como Horas de Verão, de Olivier Assayas lidaram com o tema do luto de modo menos descritivo, com dramaturgia mais inspirada e resultados cinematográficos infinitamente superiores.



# REENCONTRANDO A FELICIDADE (RABBIT HOLE)

EUA, 2010

Direção: JOHN CAMNERON MITCHELL

Roteiro: David Lindsay-Abaire, baseado em peça de sua autoria

Fotografia: Frank G. DeMarco

Edição: Joe Klotz

Direção de Arte: Ola Maslik

Música: Anton Sanko

Elenco: NICOLE KIDMAN, AARON ECKHART, DIANNE WIEST, MILES TELLER

Duração: 91 minutos

Site oficial: http://www.rabbitholefilm.com/





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