Críticas


LUGAR AO SOL, UM

De: GABRIEL MASCARO
03.06.2011
Por Carlos Alberto Mattos
O BRASIL VISTO DO ALTO

O segundo lançamento do projeto Sessão Vitrine traz ao Cine Joia, no Rio, um dos documentários mais polêmicos das últimas safras. Um Lugar ao Sol não é aquele velho clássico de George Stevens sobre ascensão social, mas um filme sobre assunto análogo. Retrata oito pessoas ou famílias que moram em coberturas de luxo no Rio de Janeiro, São Paulo e Recife. As coberturas, para o diretor Gabriel Mascaro, foram um caminho (um dispositivo) para chegar ao pensamento de um estamento social pouco visitado pelos docs brasileiros.



O filme foi muito discutido em festivais por conta do retrato pouco lisonjeiro que faz de alguns personagens e pela ética duvidosa com que Mascaro deles se aproximou. A produção contatou os entrevistados através de um folheto que apresentava Gabriel como um famoso diretor de publicidade internacional, interessado em conversar sobre a moradia em coberturas. No curso de algumas entrevistas, o tema acabava deslizando para os preconceitos e sentimentos de superioridade e segurança que alimentam o apartheid social nas grandes cidades brasileiras. Sentindo-se num contexto publicitário, as pessoas deram vazão a uma franqueza que talvez não tivessem em outra situação.



Nem tudo no filme é exaltação da diferença. Há também considerações sobre espaço, liberdade, conforto, verticalização urbana etc. Há personagens relativamente matizados. Mas dificilmente o doc não será lembrado pelas cenas explícitas de arrogância social. Um dos personagens elogia a direção por finalmente fazer um documentário sobre “uma coisa positiva”. Não intuía o quadro geral que o filme acabaria por descortinar: o de uma elite dominada pelo medo e o complexo de superioridade.



A ausência de informações sobre o processo de abordagem das pessoas e dos assuntos provoca mal-estar em parte dos espectadores, entre os quais me incluo. Embora admire a força do filme e a originalidade do tema, sinto-me presenciando o efeito de um ardil. Teria o diretor “traído” seus personagens ao estimular neles a demagogia e o preconceito? Deve-se ter com os ricos a mesma ética que se costuma ter ao filmar os pobres, ou seja, protegê-los de suas próprias palavras? São questões que vêm à cabeça depois de vermos o filme. Há mesmo um momento em que uma senhora parece cair em si a respeito do intuito da entrevista, pede para interrompê-la e sai da sala para não mais voltar.



Outros, porém, veem o resultado com naturalidade. Lembro-me de conversas que tive no Festival de Tiradentes em 2010. “Essas pessoas são cultas e informadas o suficiente para saberem o que estavam falando”, dizia Sylvie Debs, então adida cultural da França em Belo Horizonte. Para o ensaísta e professor Cezar Migliorin, havia até certa justiça poética na conduta dos realizadores: “Às vezes a gente tem mesmo que escolher o inimigo e, dependendo do inimigo, partir para a violência”.



É, pode ser.



>>> Um Lugar ao Sol passa diariamente às 19h30 no Cine Joia até a quinta-feira próxima.



UM LUGAR AO SOL

Brasil, 2009

Direção, roteiro e produção:
GABRIEL MASCARO

Fotografia: PEDRO SOTERO

Som: PHELIPE CABEÇA

Edição: MARCELO PEDROSO

Música: IEZU KAERU, LUÍS PESSOA

Duração: 71 minutos

Site oficial: clique aqui

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