Críticas


HOMEM SEM PASSADO, O

De: AKI KAURISMÄKI
Com: MARKKU PELTOLA, KATI OUTINEN, ANNIKKI TÄHTI, JUHANI NIEMELÄ
28.02.2003
Por Maria Silvia Camargo
OUTRA ESTRANHA INDICAÇÃO

Há muito o que dizer sobre O Homem Sem Passado , do finlandês Aki Kaurismäki, indicado ao Oscar de melhor filme estrangeiro. Primeiro porque o filme é uma estranha mistura de muitas idéias que nem sempre combinam entre si. Depois por ter sido feito por um diretor muito seguro de sua estética e proposta – (mesmo que a maioria do público não vá gostar ou entender). Mas, ainda que seja refrescante ter um filme alternativo e polêmico em cartaz, feito por um sujeito que tem o que dizer (ô coisa rara), a experiência é decepcionante. Senão, vejamos:



O Homem Sem Passado quer ser uma comédia, é vendido como uma comédia. Ora, não existe coisa mais individual e cultural do que o humor, certo? Mas mesmo, digamos, que este filme seja um genuíno exemplo do melhor humor finlandês – o qual desconheço – porque ele é combinado com uma direção de atores tão minimalista e teatral?



Um homem está numa estação ferroviária em Helsinque com sua mala. Na segunda cena, está sendo espancado por um bando de marginais. Depois de quase matá-lo, eles abrem a mala, e nela está um rádio de pilha e um capacete de metalúrgico. Mais tarde, no hospital, apesar de ser tido como morto, o cara ressuscita e, cheio de bandagens, sai para as ruas. É abrigado por uma comunidade carente que mora dentro de vagões de trem abandonados. Logo, percebe-se que ele perdeu a memória. E é entre a vida que vai construir e o reencontro com sua identidade que o filme segue.



Nesta trajetória ele enfrenta situações irônicas. O país – poderia ser qualquer país hoje – tem centenas de desempregados e muita burocracia. Nosso personagem é chamado a se identificar e preencher papéis, mas como, se ele não sabe quem é? Depois encontra um ladrão de bancos que lhe dá emprego - e enfrenta um cachorro chamado Hannibal, que, apesar do nome, é um doce. Em várias cenas como estas a gente dá um melancólico sorriso: o personagem central lembra Chaplin, Buster Keaton. O ambiente parece Luzes da Cidade . Mas este doce clima fica sempre entrecortado, porque os atores falam pouco, em diálogos meio surreais, como se fossem robôs e tivessem decorado suas falas. Há um terceiro elemento, também às vezes dissonante: a trilha sonora. Aki Kaurismäki adora rock e baladas antigas que derramam mel em meio à aridez da cena.



Não, o O Homem Sem Passado não chega a ser ruim. É que ele se baseia muito no humor e na ironia, elementos de receptividade altamente subjetiva. Além disto, a trajetória do filme se sustenta num dado concreto: ele foi indicado ao Oscar de melhor filme estrangeiro – e Cidade de Deus , de Fernando Meirelles, não! Depois de ter checado o outro candidato a melhor filme estrangeiro em cartaz, o despersonalizado O Crime do Padre Amaro , de Carlos Carrera, a gente não consegue assistir ao produto do colega finlandês sem achar que eles lá na Academia andam muito, muito estranhos.





#O HOMEM SEM PASSADO (MIES VAILLA MENNEISYYTTÄ)

Finlândia/Dinamarca/França, 2002

Direção, roteiro e produção: AKI KAURISMÄKI

Fotografia: TIMO SALMINEN

Montagem: TIMO LINNASALO

Elenco: MARKKU PELTOLA, KATI OUTINEN, ANNIKKI TÄHTI, JUHANI NIEMELÄ, KAIJA PAKARINEN, SAKARI KUOSMANEN.

Duração: 97 minutos

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