Críticas


ULTIMO BEIJO, O

De: GABRIELE MUCCINO
Com: STEFANO ACCORSI, GIOVANNA MEZZOGIORNO, STEFANIA SANDRELLI
04.04.2003
Por Marcelo Janot
UM CONVITE À REFLEXÃO

Carlo acaba de saber que Giulia, a namorada com quem vive junto há três anos, está grávida. Mas no minuto seguinte, numa festa de casamento, leva uma cantada de uma estonteante estudante de 18 anos e passa a questionar sua relação. Seus melhores amigos são: Alberto, que tem um lindo bebê em casa mas reclama que sua mulher não quer saber de sexo há sete meses, e está prestes a se separar; Paolo, que não consegue esquecer a ex-namorada que ele mesmo dispensou e agora está saindo com outro; e Marco, um galinha que não quer saber de compromisso sério e a cada noite leva uma mulher diferente pra cama.



Olhando assim, os personagens de O Último Beijo parecem saídos daquelas comédias românticas idiotas que Hollywood produz aos borbotões para no final vender a idéia de que o amor é lindo e que a qualquer momento você irá esbarrar com sua princesa/príncipe encantada(o). Mas não tem absolutamente nada a ver. Trata-se de um filme italiano, dirigido e escrito por Gabriele Muccino, jovem realizador que pertence a uma faixa etária em que muitos homens estão, no mínimo, confusos com os rumos que suas vidas devem tomar. Então, para nos poupar algumas sessões de análise, ele propõe uma auto-reflexão colocando na tela os diferentes matizes que compõem a cabecinha confusa do homem de 30 nos dias hoje. E mostra que sabe do que está falando - vai ser difícil encontrar alguém nessa idade que não se identifique com pelo menos um desses personagens.



O filme tem como grande mérito não fazer julgamento de valores. Se o casamento de Alberto já era e Carlo sente falta das “aventuras” que a vida de solteiro pode proporcionar, o amigo deles que acabou de casar parece bem seguro de que o matrimônio é o caminho para a felicidade. Será? Por outro lado, Marco também parece feliz com sua vida descompromissada, trocando de parceira a cada dia.



Talvez o problema maior do homem de 30 seja querer viver, ao mesmo tempo, um pouco como Marco, um pouco como Carlo e um pouco como o amigo bem casado deles. E aí a vida nos impõe a mais cruel das saídas, que é fazer escolhas – que nem sempre podem ser as certas. E tome infelicidade. Ao mesmo tempo, como saber se o que ficou para trás é que era o certo se você não tiver uma segunda chance para experimentá-lo? Muitas vezes o que sobra são só os fantasmas e as agendas de psicanalistas estão cheias por causa disso.



Este turbilhão de idéias é levado à tela de forma inteligente por Muccino. Em ritmo acelerado, ele envolve o espectador no dilema dos personagens de tal forma que mal você começa a absorver um conflito já tem outro engatilhado vindo em seguida. Outra boa sacada do roteiro é estender o consultório sentimental para outras faixas etárias. Assim, num extremo vê-se a jovem de 18 anos decidida a seduzir Carlo, mas que ainda não tem maturidade suficiente para enxergar a complexidade da situação e se entrega ao sonho romântico; no outro, a mãe de Giulia, infeliz no seu casamento silencioso de longa data – curioso que o silêncio é o responsável tanto pelo fracasso quanto pela manutenção do matrimônio.



A maturidade a fez encarar a traição como uma saída necessária, mas ela também teve que fazer escolhas – e no caso das mulheres, fazer essa escolha pode ser ainda mais doloroso e cruel do que para os homens. Ao interpretar essa personagem, a outrora belíssima Stefania Sandrelli, antiga diva do cinema italiano, mostra que o tempo é mais implacável com as mulheres (exemplificado com perfeição na cena em que ela reencontra o ex-amante, diz que está disposta a abandonar o marido, mas ele conta que agora está em outra e tem um filhinho de um ano – ela revela que vai ser avó e um abismo parece se abrir entre eles).



Muccino é um cara esperto e, dentro da ótica masculina de seu filme, as mulheres são tratadas com a devida importância. Ele sabe que são elas a causa tanto da nossa infelicidade quanto da nossa felicidade. Enquanto Carlo, Alberto, Paolo e Marco são egoístas, imaturos e irresponsáveis, Giulia, com os mesmos 30 anos, é uma mulher cheia de personalidade, segura, carinhosa...e linda (além de maravilhosamente bem interpretada por Giovanna Mezzogiorno). Porque diabos alguém pensaria em trair uma mulher como Giulia? O filme ajuda a entender isso de uma maneira bastante racional, mostrando que na longa estrada rumo à felicidade, arrependimento e segunda chance são possibilidades que deveriam ser levadas em consideração.



Mas como nem sempre se pode (ou deve) racionalizar o amor, nessa ciranda entre o compromisso e a liberdade O Último Beijo mostra que a vida sentimental, aos 30, é um moto-contínuo impulsionado pelo destino (a cena final, embora aparentemente despretensiosa, fecha com chave de ouro esta tese). O grande desafio é saber como administrar isso. Porque os 40 estão logo ali.



# O ÚLTIMO BEIJO (L’ULTIMO BACIO)

Itália, 2001

Direção e Roteiro: GABRIELE MUCCINO

Produção: DOMENICO PROCACCI

Fotografia: MARCELLO MONTARSI

Montagem: CLAUDIO DI MAURO

Música: PAOLO BUONVINO

Elenco: STEFANO ACCORSI, GIOVANNA MEZZOGIORNO, STEFANIA SANDRELLI, MARTINA STELLA, MARCO COCCI, CLAUDIO SANTAMARIA, PIERFRANCESCO FAVINO

Duração: 112 min.

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