Críticas


TRUQUE DE MESTRE

De: LOUIS LETERRIER
Com: JESSE EISENBERG, MARK RUFFALO, WOODY HARRELSON
07.07.2013
Por Marcelo Janot
Subliminarmente, faz uma interessante autocrítica às engrenagens hollywoodianas.

Os irmãos franceses Auguste e Louis Lumière inventaram o cinema no fim do século 19 deixando o espectador em pânico (e posteriormente maravilhado) com a impressão de que o trem que chegava na estação iria atravessar os limites da tela e atropelar todo mundo. George Méliès, o ilusionista que virou cineasta, foi o primeiro a perceber e explorar o potencial mágico do cinema. E Hollywood acabaria se tornando a grande meca do cinema justamente por transformar a arte cinematográfica nesse grande truque capaz de fabricar rios de dinheiro vendendo ilusões. Se recentemente Martin Scorsese prestou seu tributo a Méliès com a delicadeza poética de “A invenção de Hugo Cabret”, coube ao diretor francês Louis Leterrier, com este “Truque de mestre” (“Now you see me”), nos oferecer uma síntese de como o cinema de Hollywood, assim como os mágicos profissionais, aprimoraram seu trabalho de iludir o espectador.

Três promissores mágicos (Jesse Eisenberg, Isla Fisher e Dave Franco) e um veterano mentalista especializado em hipnose (Woody Harrelson) são reunidos para uma performance artística em Las Vegas sob o nome de Os Quatro Cavaleiros. O patrocínio é de um milionário proprietário de uma seguradora (Michael Caine), e o grande truque da noite será teletransportar um espectador até Paris para roubar um banco, fazendo com que o dinheiro voe espetacularmente até cair sobre a plateia. A partir daí, um agente do FBI (Mark Ruffalo) e outra da Interpol (Mélanie Laurent) passam a seguir cada passo do grupo, tentando desmascará-los com a ajuda de um ex-mágico (Morgan Freeman) famoso por revelar os truques dos ilusionistas.

Quando Stanley Kubrick dirigiu “O grande golpe” (“The killing”) em 1956, ele mostrou como um roteiro impecável permitia ao diretor desenvolver seu talento para narrar uma história. Mas a crise de boas ideias que tomou conta da meca do cinema nos anos seguintes fez com que um dos truques que Hollywood passasse a usar com frequência, em filmes como “Onze Homens e Um Segredo” e similares, fosse o de não permitir que o espectador tivesse tempo para assimilar a quantidade de detalhes que, juntos, formam tramas labirínticas recheadas de furos.

Em “Truque de Mestre”, como em tantos filmes do gênero, envolve-se o espectador passivamente na intricada trama, através de uma direção frenética, e depois se oferece de bandeja a resposta. Visto por esse ângulo, trata-se apenas de mais uma diversão corriqueira em ritmo alucinante. O espectador torce para os mágicos golpistas, e não para esses chatos do FBI que os querem trazer de volta ao mundo real. O papel do crítico é, de certa forma, similar ao dos investigadores.

Cabe ao crítico ser o ”estraga-prazeres” que vai observar como o filme, subliminarmente, faz uma interessante autocrítica às engrenagens hollywoodianas. “Quanto mais perto você olha, menos você vê”, é o lema de um dos personagens. “Estar isolado na cadeia nos permite pensar com mais calma”, diz outro. Mas como chegar a esse distanciamento, ao tempo para a reflexão, envolvido por tão prazeroso entretenimento? Estimular esse grande desafio no espectador é o papel do crítico quando nos deparamos com filmes como esse. Por que, caso contrário, tudo acabará se limitando a mais uma história sobre um truque mirabolante e que no final ajuda a transmitir a mensagem de que nos Estados Unidos a vingança se faz com as próprias mãos, mesmo com uma moral de justiça social (o crime justificado pela redistribuição de renda). Já vimos esse filme antes. Mas “Truque de mestre” tem algo mais.

Voltar
Compartilhe
Deixe seu comentário