Críticas


JOGO DAS DECAPITAÇÕES

De: SÉRGIO BIANCHI
Com: FERNANDO ALVES PINTO, SILVIO GUINDANE, CLARISSE ABUJAMRA, PAULO CÉSAR PEREIO
21.06.2014
Por Carlos Alberto Mattos
Parábola paranóica sobre oportunismo e barbárie

Sergio Bianchi costuma estar inteiro e combativo em seus filmes. Em Jogo das Decapitações, ele está em dose dupla através de dois personagens que o representam. Um deles é Jairo Mendes, cineasta maldito dos anos 1970, hoje preso por um crime passional e talvez morto numa rebelião do presídio. Jairo tem um filme perdido e reencontrado, cujas cenas são de Maldita Coincidência, o primeiro longa de Bianchi, um estudo sobre a inércia resultante das discussões ideológicas sem fim. O outro personagem é um jovem niilista (Silvio Guindane) especializado em contestar e duvidar de tudo o que encontra pela frente. Mas o centro dessa parábola paranóica não é nenhum alterego do diretor, mas sim um jovem mestrando (Fernando Alves Pinto) que pesquisa sobre a resistência à ditadura e sofre uma grande modificação à medida que se depara com a violência social das grandes cidades brasileiras.

Bianchi trata aqui de tortura e linchamento, ou seja, a violência do estado e a violência da sociedade. De um lado, coloca em xeque a busca de indenizações pelos ex-ativistas de esquerda, criticando o discurso de vítima e as benesses daí decorrentes. De outro, ataca a selvageria dos justiçamentos sumários que vêm chocando o país recentemente. A decapitação é uma forma de cortar o pensamento, condição fundamental tanto para o oportunismo como para a barbárie.

Quem viu Cronicamente Inviável e Quanto Vale ou é por Quilo?, entre outros filmes seus, sabe o que esperar de Bianchi em sua posição de franco-atirador. Ele bota o dedo nas feridas de qualquer lado do espectro político, com especial atenção para a hipocrisia bem-pensante e a autopiedade produtiva. Nesse novo filme ele leva de roldão as opiniões sobre as cracolândias, as manifestações do gênero "Ocupa", as iniciativas tipo Comissão de Anistia, os documentários políticos melodramáticos e a transformação de ideais em grifes e produtos. No entanto, em meio a tantos alvos, o filme frequentemente perde a mira e o foco. O roteiro se compõe mais de esquetes que de um fio narrativo, sendo bastante prejudicado pelas fragilidades da mise-en-scène. As ideias são explicitadas verbalmente ou na forma de placas, faixas e cartazes. Sentimo-nos como se diante de um pregador cínico e cético que aponta o dedo e chama nossa atenção seguidamente. Desafinar o coro dos contentes é atitude sempre positiva, mas não dispensa a exigência da eficácia.

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