Críticas


PEIXE GRANDE

De: TIM BURTON
Com: EWAN MCGREGOR, ALBERT FINNEY, BILLY CRUDUP, JESSICA LANGE
25.02.2004
Por Carlos Alberto Mattos
O LEÃO NO TAPETE

A mentira é constitutiva do próprio cinema. E Tim Burton tem sido um dos mais devotados cultores dessa vocação. Em fábulas insólitas como Beetlejuice, Eduardo Mãos de Tesoura, A Lenda do Cavaleiro Sem Cabeça e mesmo em blockbusters como Batman e O Planeta dos Macacos, independente da qualidade irregular do resultado, predomina a visão do cinema como terreno aberto à fantasia. Para concretizá-la, ele lança mão de um estilo visual imaginativo, uma iluminação anti-natural e formas de interpretação que evocam o circo, os contos-de-fadas etc.



Tudo isso está presente, mais uma vez, em Peixe Grande. Mais que qualquer filme anterior de Burton, este é sobre a mentira como traço essencial da narração de histórias. A vida do mitômano Edward Bloom (Ewan McGregor/Albert Finney) desfila através de relatos episódicos, nos quais a fotografia do genial Philippe Rousselot assume tonalidades mais quentes e filtros que os isolam da dimensão factual. Peixe Grande é, até certo ponto, uma celebração desse universo fantástico das mentiras e do cinema. Tem gigante, lobisomem, bruxa de olho vazado, cidade onde os sapatos não são bem-vindos, campo de narcisos surgido da noite para o dia, visões premonitórias, reviravoltas improváveis.



Alguma coisa, porém, impede, mais uma vez, que Tim Burton se saia com um grande filme. De certa forma, é como se Peixe Grande temesse dar autonomia de vôo à imaginação, com medo de perder o vínculo com a demanda de realidade de parte da platéia. Seguidamente, somos arrebatados pela poderosa excitação de mais uma “história de pescador” que começa a ser contada. Mas, logo em seguida, o roteiro sabota nossa viagem com a lenga-lenga racionalista do filho de Edward, interessado em conhecer a “verdade” do pai à beira da morte. A insistência de William em definir os relatos do pai como lorotas é uma maneira de dar satisfações a um suposto espectador incrédulo, quando na verdade o nosso maior prazer é embarcar na sinceridade daquelas mentiras. Especialmente quando elas são protagonizadas por um ator como Ewan McGregor, capaz de sublinhar a inocência do mentiroso e a determinação em fazer de seu desejo uma varinha de condão.



O fantasma da mediocridade assusta principalmente no desfecho do filme, quando se dá uma mais que previsível conversão e a “mensagem” do filme é esfregada na nossa cara, empestando tudo como peixe em fim de feira. Ao se curvar às obviedades do roteiro e flertar com o divertimento para-toda-a-família, Tim Burton mostra que é um fabulador vacilante. Em Big Fish, a mentira está domada e inofensiva como uma pele de leão transformada em tapete.





# PEIXE GRANDE (Big Fish)

EUA, 2003

Direção: TIM BURTON

Roteiro: JOHN AUGUST, baseado em romance de DANIEL WALLACE

Fotografia: PHILIPPE ROUSSELOT

Direção de arte: DENNIS GASSNER

Montagem: CHRIS LEBENZON

Música: DANY ELFMAN

Elenco: EWAN MCGREGOR, ALBERT FINNEY, BILLY CRUDUP, JESSICA LANGE, ALISON LOHMAN, HELENA BONHAM-CARTER, DANNY DEVITO, STEVE BUSCEMI

Duração: 125 minutos

Voltar
Compartilhe
Deixe seu comentário