Críticas


ELEFANTE

De: GUS VAN SANT
Com: ALEX FROST, ERIC DEULEN, JOHN ROBINSON
11.04.2004
Por Daniel Schenker
A SUBJETIVIDADE DE CADA UM

Nem a cultura do medo, nem a repressão às diferenças. Em Elefante , o cineasta Gus Van Sant aponta para a subjetividade de cada um. É a apropriação pessoal de fatos da realidade que pode realmente dizer sobre a realização de atos brutais, como o dos dois estudantes que metralharam alunos e professores na escola Columbine, em Littletown, Colorado. Por isso, Van Sant utiliza o fato verídico, documentado por Michael Moore no contundente Tiros Em Columbine , para tentar registrar estruturas mentais – no caso, de estudantes (interpretados por não-atores, que emprestaram, em alguns casos, seus verdadeiros nomes para as personagens). Alcança seqüências de impactante atualidade, sustentadas pela integração entre som e imagem. Numa delas, uma menina, constrangida em mostrar o próprio corpo, ouve expressões de deboche no vestiário feminino e a câmera capta a repercussão interna desta escuta.



Assim como o espectador, a câmera de Van Sant observa os estudantes, procura perceber como “fotografam” o mundo e ora acompanha o movimento deles pelo colégio, ora se limita a um estado contemplativo. De um modo ou de outro, não interfere – talvez por não querer tangenciar a questão da manipulação da imagem, ainda que o diretor não pareça acreditar muito nesta possibilidade de poder. A ausência de intervenção não implica numa renúncia da autoria, muito pelo contrário. Tanto que nada em Elefante é utilizado tão-somente como requisito técnico, como fica atestado no trabalho do cineasta com diferentes camadas sonoras. Há os barulhos convencionais de uma escola, captados em off e utilizados para preencher cenas como a do embate silencioso entre o diretor da escola e um dos alunos; a transformação deste som num somatório de vozes impositivas que assaltam as mentes de alguns alunos; e, em menor escala e importância, o som da trilha designado para passagens selecionadas.



A transição da esfera sonora para um quase silêncio também tem efeito aterrador, como no gesto macabro de um dos assassinos no exato instante em que deixa de tocar piano ou na mutação do céu azul para as nuvens carregadas de uma tempestade que se anuncia. Uma imagem aterradora e sintetizadora do tom geral de Elefante , um filme que mostra que há algo de ameaçador por trás de corriqueiros flagrantes do cotidiano. Não por acaso, por mais repleta de gente que esteja a escola, muitos estudantes precisam se isolar em algum instante em espaços privados, como as cabines de banheiros, a sala de revelação de fotos, um ginásio e uma sala vazios. Não importa tanto que a solidão seja, por vezes, compartilhada e que, diferentemente de Macbeth (evocado no filme através de uma frase, “Nunca vi um dia assim, tão belo e feio”), os jovens sustentem uma aparência melancólica e serena. A personagem de Shakespeare talvez lembre, isto sim, que as pessoas agem de formas as mais variadas conforme a especificidade de seus funcionamentos psíquicos.



# ELEFANTE (ELEPHANT)

EUA, 2003

Direção, Roteiro e Montagem: GUS VAN SANT

Produção: DANY WOLF

Fotografia: HARRIS SAVIDES

Elenco: ALEX FROST, ERIC DEULEN, JOHN ROBINSON, KRISTEN HICKS

Duração: 81 minutos

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