Críticas


NAHID: AMOR E LIBERDADE

De: IDA PANAHANDEH
Com: SAREH BAYAT, NAVID MOHAMMD ZADEH, PEJAMN BAZEGHI
01.08.2016
Por Ely Azeredo
As imagens assumem linguagem soberba

Primeiro longa-metragem para as telonas escrito e dirigido por Ida Panahandeh, Nahid - Amor e Liberdade lembra alguns enfoques do soberbo A separação, de Asghar Farhadi, que conquistou o Oscar de melhor filme estrangeiro em 2012. Sobretudo na abordagem das peculiaridades jurídicas, traumas sociais e morais do figurino que reveste os processos de divórcio e “recasamento”no Irã - que admite o estranho "divórcio temporário". Outra conexão entre as duas produções é a extraordinária performance de Sareh Bayat (aqui, no papel-título), protagonista absoluta do filme em lançamento e importante personagem de A Separação.

'Nahid, é estranha aos olhos de todos em sua luta para permanecer livre. Ainda que vivendo de magro salário de datilógrafa e atrasando o aluguel, abre mão da mesada do ex-marido, 'Ahmad' (Navid Mohamm Zadeh) para manter a custódia do filho. Ahmad insiste em proclamar seu amor, mas não consegue driblar os vícios do jogo e da cocaína. Grande é a atração entre Nahid e o doce 'Massoud' (Pejman Bazeghi), proprietário de hotel - sempre em investidas para um relacionamento duradouro. O máximo que a namorada aceita discutir é um "casamento temporário". Solução fácil? Embora institucionalizado, esse status é mal visto. Outro temor para a mulher, que vive sob teto temporário, apelando a pequenos empréstimos. E que não resiste a tentações de consumo, como a compra de um dispendioso sofá, destoante em sua esquálida moradia.

O marido, que insiste no antigo status, é a pedra no caminho: ameaça requerer a guarda do filho. No Irã, em caso de divórcio, a guarda das crianças é confiada ao pai.

A posição da mulher na sociedade iraniana continua ascendente - a anos-luz de distância dos primeiros anos pós-revolução. Até o número de mulheres cineastas continua ascendente. Mal vista por seu vai-e-vem nas ruas da pequena cidade do Norte, à margem do mar Cáspio, está distante das protagonistas de Teerã - como a esposa de A separação. Permanece alheia à transição entre a tradição e a modernidade, evidente no país.

Ida Panahandeh escreveu (com Arsalan Amin) o roteiro para um filme em que as imagens assumem linguagem soberba. Comandou todo o processo. Inclusive as discussões prévias com a Censura, que no Irã engaveta muitos projetos. Foi extremamente feliz sua escolha das locações na portuária Ansali e do elenco – cenários e figuras que lembram o habitat de obras do neo-realismo italiano. Também formada como operadora de câmera, a cineasta criou imagens de singular cromatismo.

(Publicado previamente em "O Globo", 29-7-16)

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