Críticas


SIGNO DO CAOS, O

De: ROGERIO SGANZERLA
Com: OTÁVIO TERCEIRO, SALVIO DO PRADO, HELENA IGNEZ, GUARÁ RODRIGUES
14.11.2005
Por Daniel Schenker
SGANZERLA FIEL AOS SEUS PRINCÍPIOS

“Antigamente, o mundo era em preto e branco”, explicam para uma menininha que passeia por uma paisagem verdejante lá pelo fim de O Signo Do Caos . Mas é certo que Rogério Sganzerla prefere mesmo o mundo em p&b. Não se trata exatamente de uma oposição à atualização das imagens, ainda que Sganzerla seja esperto o suficiente para não se deslumbrar com cada (suposta?) descoberta dos novos tempos. Parece, isto sim, que o diretor não precisa do apoio da cor – e a parte colorida de O Signo Do Caos é visivelmente menos interessante do que a filmada em preto e branco – justamente porque já sabe “de cor”.



Assim, Rogério Sganzerla não sente necessidade de abrir mão de sua estética e aderir a um diálogo escorado numa negociação com o padrão tecnológico do cinema realizado nos dias de hoje dentro e fora do Brasil. Ao contrário, utiliza a estética como ferramenta de discussão com os seus pares – não só os de geração como todos os colegas de ofício que externam, através dos filmes, posturas relativas ao quadro atual da produção nacional.



“Daqui em diante só sairão deste país filmes saudáveis e milionários para não fazer vergonha no exterior”, afirma, convicto, Dr. Amnésio, o censor-mór interpretado por Otávio Terceiro. É uma tirada certeira contra a ideologia do cinema de exportação, em alguma medida vigente no Brasil e, por extensão, uma cutucada na ânsia dos cineastas em recuperar a comunicação de priscas eras com uma ampla faixa de espectadores através de filmes repletos de concessões que talvez levem a resultados impessoais.



Sganzerla, é claro, está falando do lugar de quem não faz concessões, de quem suporta a solidão de um púbico reduzido para encontrar uma companhia de qualidade. Contudo, em momentos de O Signo Do Caos transparece um tom de autolouvação. O fato do cineasta acertar ao manter sintonia com as questões que norteiam o aqui/agora, sem se deslumbrar com modismos visuais, não responde por completo a uma pergunta: até que ponto a louvável resistência de Sganzerla surge misturada a uma certa autocomplacência?



A própria estética, parte integrante de um diálogo vivo com a contemporaneidade, soa, paradoxalmente, como um porto seguro. Nesse sentido, a taxa de risco, quesito principal de todo trabalho artístico, é suavizada pela repetição segura não de uma assinatura autoral mas sim de uma marca padrão. Uma acomodação que não anula a inquietude de um diretor que defende o cinema-arte que costuma ficar confinado numa esfera subterrânea, o encontro com um genuíno sentido de nacionalidade e a sustentação da memória, facilmente relegada ao esquecimento.



Toda esta defesa é afirmada através da negação, da desconstrução via frases sempre debochadas e/ou sarcásticas, proferidas pelo censor reacionário, como “Vou abrir a barriga do Brasil para ver o que tem dentro”, “Nunca trate um gênio como idiota para que não tenhamos que tratar um idiota como gênio” e “O Brasil é o país do futuro – dizem” (esta última farpa, uma alusão a Stefan Zweig, autor do célebre “Brasil, país do futuro”?).



Apesar do humor, O Signo Do Caos capta a deterioração de um mundo que, ao contrário de boa parte dos vigorosos trabalhos experimentais, parece fazer cada vez menos sentido. “Sou apenas um observador de um sonho que se desfaz. Sou um cinema ambulante”, declaram, num dado momento do filme (ou do “anti-filme”, como definido logo no início da projeção). Palavras que podem ser atribuídas ao próprio Rogério Sganzerla que escolheu o cinema como meio capaz de eternizar imagens reveladoras de ideologias que talvez não existam mais.



# O SIGNO DO CAOS

Brasil, 2003

Direção, Roteiro e Produção: ROGERIO SGANZERLA

Fotografia: NELIO FERREIRA E MARCOS BONISSON

Montagem: SILVIO RENOLDI E ROGERIO SGANZERLA

Música: SINAI SGANZERLA

Elenco: OTÁVIO TERCEIRO, SALVIO DO PRADO, HELENA IGNEZ, GUARÁ RODRIGUES

Duração: 83 min.

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