Críticas


ALÉM DA ILUSÃO

De: REBECCA ZLOTOWSKI
Com: NATALIE PORTMAN, LILY-ROSE DEPP, EMMANUEL SALINGER, LOUIS GARREL
27.04.2017
Por Luiz Fernando Gallego
O roteiro acumula temas e situações nem sempre desenvolvidas satisfatoriamente.

Trata-se de um filme que aborda a mediunidade como um de seus temas centrais, mas com uma posição bem ambígua em relação à veracidade dos poderes extra-sensoriais da personagem adolescente Kate Barlow (interpretada por Lily-Rose Depp, filha de Vanessa Paradis com Johnny Depp). Ela parece ser, de certo modo, explorada pela irmã mais velha, Laura (Natalie Portman). Não saberemos quase nada dos antecedentes das duas, exceto que são americanas com provável residência em Londres, sendo logo mostrado que fazem números de suposta mediunidade em casas noturnas parisienses na década de 1930, além de serem eventualmente chamadas para “sessões” (espíritas) particulares.

Um homem de meia idade, André Korben, que está enfrentando uma crise financeira na produtora de filmes da qual é membro do conselho, chama a dupla para uma dessas sessões privadas em sua casa, durante a qual ele parece entrar numa espécie de transe, preocupando a mais velha que conduz a coisa mais como espetáculo.

Em algum momento veremos o que ele sentiu: mãos masculinas sobre seus ombros e também quase o sufocando. Ele diz que seria o espírito de um irmão falecido, o que será negado assertivamente pela irmã mais jovem em conversa com a outra.

Em uma nova “sessão” há uma sugestão de que André fica sexualmente excitado nesses momentos. Assim como em outra ocorrência dessas, sem a presença de Laura, as respirações acentuadas de André e de Kate são idênticas ao ritmo ofegante de uma relação sexual sem que estejam transando, pelo menos, fisicamente. Tudo isso só faz deixar mensagens ambíguas, não só quanto à sexualidade deste homem (Emmanuel Salinger em interpretação que alimenta o tom de dúvidas que o filme pretende deixar): também ficam no ar o “dom” de Kate, no qual ela parece acreditar como verdadeiro; assim como a crença ou descrença de Laura neste “dom” da irmã. E o que Laura realmente pretende depois de se transformar em atriz central de um filme que é produzido por Korben?

O roteiro, assinado pela diretora Rebecca Zlotowski (de Grand Central, 2013) e por Robin Campillo (de alguns filmes de Laurent Cantet), acumula várias outras situações que são colocadas no roteiro, mas nem sempre desenvolvidas, como o antissemitismo francês, crescente na época, instigado pelo nazismo. Fica a dúvida se o excesso de intenções prejudica a clareza do que se queria demonstrar ou se, de fato, há intencional busca de ambiguidade em tudo que é ventilado. Nem o título original (Planetarium) fica suficientemente esclarecido pelas imagens celestes, reais ou de estúdio, vistas nas duas pontas do filme.

Mais surpreendente é a presença dos irmãos Dardenne como co-produtores de um filme muito diferente do que eles costumam fazer. Prestígio, a diretora parece ter: além de Natalie Portman (ótima), temos Louis Garrel em um papel pequeno e uma produção caprichada.

O interesse do espectador é alimentado pelos vários caminhos mais ou menos divergentes que o roteiro toma, mas a curiosidade crescente fica mal satisfeita com o relativamente súbito desfecho, insólito pelo fato de não explicitar o que este filme pretenderia. Talvez uma senha para compreendê-lo esteja na definição que Laura dá sobre o “dom” de sua irmã ao dizer algo como “ela faz com que as pessoas acreditem que o que elas desejam pode existir”. Afinal, o Cinema pode filmar espíritos? Faz acontecer nossos desejos inconscientes ou não? Existem semelhanças entre o Cinema e os números (falsos ou não) de mediunidade? O que são, afinal, as imagens preservadas pelos filmes além de ilusões ou "fantasmagorias"?

A filha de Johnny Depp? Está muito bem no papel, desde que aceitemos que o filme não veio para esclarecer, mas para confundir.

Voltar
Compartilhe
Deixe seu comentário



Outros comentários
    4550
  • Allard Amaral
    02.05.2017 às 06:53

    "Além da Ilusão" é um filme francês "cabeça" dirigido por uma mulher. Trata de Mediunidade,Cinema e União de forças (duas irmãs médiuns). Para mim o tema principal é animismo, interpretação da meduinidade. As vezes um pouco confuso, mas vale o ingresso !