Críticas


UNA

De: BENEDICT ANDREWS
Com: ROONEY MARA, BEN MENDELSOHN, RUBY STOKES
27.04.2017
Por Marcelo Janot
O maior mérito de “Una” é lidar, sem fazer julgamentos, com as consequências de um relacionamento amoroso e sexual entre uma menina de 13 anos e um homem de 40.

O maior mérito de “Una” é lidar, sem fazer julgamentos, com um tema tão explosivo quanto as consequências de um relacionamento amoroso e sexual entre uma menina de 13 anos e um homem de 40. Ao longo de uma hora e meia, o espectador terá subsídios suficientes para conhecer Una e Ray e chegar às suas próprias conclusões – ou não chegar a conclusão nenhuma, o que também é saudável quando uma obra nos oferece tantas variáveis.

Baseado em uma peça de David Harrower (que é o autor do roteiro), o filme preserva muito da estrutura teatral, com os dois protagonistas dialogando o tempo todo em praticamente um único ambiente, a cafeteria de uma fábrica após o expediente. É ali que Una e Ray vão se reencontrar para “lavar a roupa suja” 15 anos depois de ele ter sido preso e condenado por manter relações com a adolescente.

É o primeiro longa do diretor Benedict Andrews, oriundo do teatro, o que claramente influenciou na construção da mise-en-scène e na direção dos atores (Rooney Mara e Ben Mendelsohn têm desempenhos extraordinários). A narrativa privilegia o embate verbal, cuja tensão pode ser notada também pela expressão corporal dos personagens.

A cada flashback é relembrado, sob o ponto de vista dos dois, o que se passou (Una adolescente é vivida por Ruby Stokes, que também tem grande atuação alternando momentos em que se apresenta como uma Lolita nabokoviana, sedutora e decidida, e outros em que demonstra a fragilidade e insegurança típicas da adolescência). Logo no início do filme se revela que durante o julgamento Una declarou amar Ray, e o que se vê a seguir permite que se chegue à conclusão que a relação entre os dois fora consensual. Mesmo assim, ele foi condenado e preso. 15 anos depois, enquanto Ray tenta recomeçar a vida casado com uma mulher da idade dele e jura que nunca teve interesse em nenhuma outra adolescente que não fosse ela, Una expõe as marcas da ferida deixada pelo relacionamento.

Ao lembrarmos a naturalidade com que a sociedade brasileira encarou a relação amorosa de Caetano Veloso com a então adolescente Paula Lavigne, sem que ele fosse acusado criminalmente por isso, é o caso de se pensar, a partir do que o filme mostra, o que teria ou não acontecido com Caetano se fosse nos dias de hoje.

“Una” não é uma história de vingança, de uma vítima indo atrás de seu algoz com o intuito de fazê-lo pagar pelo seus erros. O filme escapa dessa fácil armadilha. “Una” é um filme sobre a cicatrização da personagem que dá nome ao filme, cujo processo, doloroso, não oferece respostas óbvias.

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