Artigos


PAGUE POR UM E VEJA A METADE

11.01.2014
Por Marcelo Janot
O desastroso lançamento de "Ninfomaníaca" em duas partes é um desrespeito com o espectador e consumidor

Houve um tempo em que quando um filme de quatro horas de duração era lançado nos cinemas, as sessões tinham um intervalo de pelo menos cinco minutos na metade do filme. Ao longo de diversas décadas, produções hollywoodianas, como “E o vento levou...” e “Cleópatra”, ou europeias, como “A Bela Intrigante”, eram exibidas dessa maneira. Hoje a coisa é feita de maneira diferente. Os produtores descobriram um jeito de tentar faturar em dobro: divide-se o filme ao meio e lança-se como se fossem dois filmes, com um intervalo de meses entre eles. Assim o espectador paga dois ingressos para ver um filme só. Simpático, não?

Tarantino fez isso com “Kill Bill”, que poderia ter resultado em uma obra-prima de 3 horas, mas foi esticado para quatro horas para render dois filmes. Ali ao menos havia o cuidado de se criar suspense em relação à segunda parte, sem mostrar o rosto do misterioso Bill na primeira. Mas “Kill Bill – vol. 1” não deixava de ser um filme incompleto.

A coisa se repete agora com “Ninfomaníaca”. Desde que a produção fora anunciada, uma estratégia de marketing bastante eficiente ia liberando aos poucos pistas sobre o que seria esse tão aguardado projeto “pornográfico” de um diretor já chegado a uma polêmica como é o dinamarquês Lars Von Trier. Quando o trailer e as fotos de divulgação finalmente chegaram aos cinemas e aos veículos de comunicação, a imagem mais marcante e divulgada era uma cena em que a atriz Charlotte Gainsbourg aparece nua ao lado de dois homens negros.

Segundo se comentou, o filme teria ficado com mais de cinco horas de duração. Com cortes no que seriam as cenas de sexo mais explícitas, a contragosto do diretor, a duração caiu para quatro horas, mas continuou sendo um filme só. Mas eis que, subitamente, resolve-se desmembrá-lo em dois, num claro desrespeito com o espectador que paga para ver um filme e só vê metade. Ao contrário de “Kill Bill”, com “Ninfomaníaca” isso foi feito sem o menor cuidado em se criar um desfecho que forneça alguma deixa para a segunda parte. O filme simplesmente é interrompido subitamente após o fim do quinto capítulo. Entram os créditos e, junto com eles, as cenas dos próximos capítulos, como nas novelas de antigamente.

Sabe a cena de Charlotte Gainsbourg com os negões, que aparece ilustrando muitas matérias sobre “Ninfomaníaca”? Ela pertence à segunda metade. Eu, se fosse você, guardava o ingresso. Vai que até março o Procon toma uma atitude ou o cinema resolve fazer alguma promoção. O duro é ter que pagar ingresso duas vezes para ver um filme só, especialmente quando a primeira metade já não é lá essas coisas.

Voltar
Compartilhe
Deixe seu comentário



Outros comentários
    1170
  • Gustavo
    12.01.2014 às 13:19

    Mas quanto chilique por conta de uma bobagem! Desde a década de 1910, cinema é business. Portanto, esse procedimento (que não julgo o ideal, mas entendo) é totalmente plausível.