Críticas


STEVE JOBS

De: DANNY BOYLE
Com: MICHAEL FASSBENDER, KATE WINSLET, JEFF DANIELS, SETH ROGEN
25.01.2016
Por Marcelo Janot
A marca de uma grande atuação: o ator que te faz acreditar num personagem que você conhece muito pouco.

Nunca fui um Applemaníaco, embora até hoje não veja um substituto à altura para o Macbook Pro que possuo desde 2011, e que fez do meu PC de mesa um obsoleto objeto de museu. Tampouco cultuo figuras como Bill Gates, da Microsoft, e Steve Jobs, da Apple, a quem só conheci através da leitura de uma ou outra matéria de jornal, sobretudo por ocasião de seu falecimento em 2011.

Portanto, essa falta de vínculo afetivo/emocional fez com que não criasse nenhuma expectativa em relação ao filme “Steve Jobs”, de Danny Boyle. E isso talvez tenha permitido que enxergasse melhor suas qualidades e defeitos. Mesmo sem ter a menor ideia de como Steve Jobs andava, falava ou se parecia quando jovem (só conheço aquela imagem clássica do executivo despojado de camisa de gola rolê, jeans e tênis), fiquei com a sensação de que ele era exatamente como Michael Fassbender o incorpora no filme. Essa é a marca de uma grande atuação: o ator que te faz acreditar num personagem que você conhece muito pouco. Num filme em que o protagonista está o tempo inteiro em cena e fala quase sem parar, isso faz toda a diferença.

“Steve Jobs” melhora se você assiste à outra cinebiografia ficcional sobre o mesmo personagem, feita em 2013 – “Jobs”, de Joshua Michael Stern. Em primeiro lugar por que, quando se vê o ator Ashton Kutcher no papel de Steve Jobs, sua falta de talento é tão gritante que deixa a impressão de que incorporar um personagem, para ele, significa apenas copiar seu esquisito jeito de andar. Além disso, é muito mais saudável ver um filme que desafia as convenções de roteiro de uma cinebiografia de personalidade famosa. No lugar da estrutura engessada em um longo flashback que mostra o surgimento e a ascensão de Jobs em ordem cronológica como no filme de 2013, o roteiro de Aaron Sorkin para o filme de Danny Boyle se estrutura no aqui e agora de três momentos marcantes da trajetória de Steve Jobs: os lançamentos do Macintosh em 1984, do Next, em 1988, e do iMac, em 1998. Os raros e rápidos flashbacks inseridos no meio de cada um desses atos ajudam a explicar fatos de sua biografia, mas não são preponderantes para o que roteiro pretende atingir, que é traçar um perfil sobretudo psicológico de um dos empreendedores mais relevantes do mundo contemporâneo – e mostrar o quanto o lado capitalista do empreendedor anda lado a lado com o idealismo vendido por eficientes campanhas de marketing.

Isso não impede, entretanto, que o filme derrape em algumas armadilhas. Personagem fundamental na ascensão de Jobs, o programador Steve Wozniak (Seth Rogen) é desperdiçado como um chato que se limita a passar o filme inteiro cobrando de Jobs o reconhecimento pela criação do pioneiro Apple II, antecessor do Mac. E o gran finale clichê, com trilha sonora épica, é uma derrapada de Boyle que remete aos seus recentes fiascos. Por um instante, ele quase nos faz esquecer que estamos diante de uma obra corajosa, não só por sua estrutura calcada quase o tempo todo nos diálogos, mas também por oferecer um retrato do gênio cheio de contradições, longe da biografia chapa branca que poderia ter sido.

Voltar
Compartilhe
Deixe seu comentário