Desde 31/01/12, a Caixa Cultural (Rio), está exibindo a Mostra John Waters – O
Papa do Trash com curadoria de Mario Abbade, jornalista e presidente da Associação de Críticos de Cinema do Rio de Janeiro (ACCRJ).
Às vezes as pessoas me escrevem e dizem que eu dei a elas coragem para fazer algo que eu provavelmente diria a elas para não fazer. Você tem que lembrar: são fantasias. Eu escrevo roteiros, eu não faço essas coisas.
A declaração de John Waters pode surpreender quem conhece o diretor americano por filmes iconoclastas como Pink Flamingos, ou mesmo títulos mais populares como Hairspray. Underground, camp e trash são as palavras mais associadas ao nome de Waters – e deixam claro como o cineasta costuma ser visto.
O fato de esses rótulos serem tão facilmente pregados em Waters pode até fazer com que fique difícil definir a que gênero pertence sua obra. Mas um predicado é certo: a classe média norte-americana nunca foi retratada de forma tão chasqueada como em seus filmes. O diretor descortina um lado da realidade que nunca é convidado para se sentar à mesma mesa que o american dream.
John Waters aborda um universo particular, tido como inconcebível mesmo nos sonhos mais devassos da maioria. Movido por um humor cáustico que serve de combustível aditivado, seu trator segue triturando tabus. E, quando os fiscais do bom gosto avaliam que a imoralidade e o escárnio chegaram ao seu patamar mais baixo, John Waters empurra ainda mais os limites, para bem longe do convencional.
No entanto, o diretor já esclareceu que o que faz é uma espécie de justiça com a própria câmera: Todos os meus filmes são muito morais. Os oprimidos sempre vencem. As pessoas amargas são punidas, e as pessoas que estão felizes com elas mesmas ganham. São todos sobre guerras entre dois grupos de pessoas, geralmente envolvendo moda, que significa padrões de conduta. É parte de uma campanha ao longo da vida contra as pessoas lhe dizendo o que fazer com os seus próprios assuntos.
Waters é considerado um precursor, já serviu de objeto de teses em diversas universidades no planeta. Seus filmes são representativos da produção norte-americana que vai de encontro ao cinemão tradicional. Situações estapafúrdias que misturam violência e comédia são uma de suas marcas. Num primeiro momento, elas podem soar agressivas, mas essa impressão não resiste a um olhar mais crítico – e revelador de que a tentativa de chocar tem como objetivo questionar conceitos impostos. Não à toa, o que há de único em seus filmes fez com que obras suas emergissem do underground para cair nas graças do mainstream.
Seus primeiros projetos guardam uma ousada paixão pelo grotesco. Há, em Waters, uma fascinação pelo choque entre o sagrado e o profano. “Eu não me arrependo de nenhuma das selvagerias dos meus primórdios, tenho um verdadeiro carinho com esse período. Mas eu acho que haveria algo de errado se eu me comportasse daquele jeito agora. Você deve ter suas crises de identidade quando é jovem, caso contrário, você terá uma vida adulta infeliz”, já disse o cineasta.
Depois de romper muitas barreiras, o eterno irreverente John Waters enveredou por uma fase com histórias um pouco mais convencionais. Mas o foco de seus personagens nunca mudou: os excluídos, os maltratados, aqueles com comportamentos considerados desviantes. Waters deu voz aos outsiders, aos grupos sexuais acostumados a viver num limbo à margem da sociedade. É a aceitação do diferente, do singular, o rompimento com os dogmas que dá o tom.
Para além do star system, protagonistas fora dos padrões estéticos estrelam histórias que louvam o desigual. Seu ator/atriz assinatura, que protagoniza seus filmes, é um travesti obeso, conhecido pelo nome de Divine. Eu sempre tive que lutar para usar Divine em meus filmes. Ninguém nunca quis que eu fizesse isso. Ele teria ficado louco se visse que uma drag queen heterossexual (interpretada por Robin Williams, em “Uma Babá Quase Perfeita”, de 1993) chegou ao posto de filme número um na América. Se você tem uma mulher, amam te ver de drag. Se você não tem: “Pervertido!”
Ainda hoje, mesmo com todas as transformações sociais das últimas décadas, os filmes de John Waters continuam chocando. Seus longas mais polêmicos – e responsáveis por inaugurar uma nova percepção – foram lançados no final dos anos 60 e início dos 70. Cineastas como Jim Jarmusch (Estranhos no Paraíso), Hal Hartley (Confiança) e David O. Russell (Três Reis) já declararam o quanto a filmografia de Waters os influenciou e foi importante para seus projetos. Muitos descobriram com ele que havia outras maneiras de se fazer cinema, diferentes das usuais.
Assistir aos filmes de Waters – assim como ver suas apresentações ao vivo, seus trabalhos de artes plásticas, ou qualquer outra das formas de expressão que o diretor usa para destilar sua verve – é uma maneira de entender um dos capítulos mais interessantes da história do cinema e da cultura. A mostra John Waters – O Papa do Trash reúne pela primeira vez todos os longas dirigidos pelo cineasta, além de curtas e produções em que ele exerceu as funções de roteirista, narrador, apresentador ou intérprete de si mesmo. A programação tem também um apêndice com todos os longas de outros diretores que tiveram como estrela Harry Glenn Milstead – a famosa e única Divine.
Passados 48 anos desde que John Waters empunhou sua primeira câmera de 8mm, o diretor continua com o mesmo senso de humor e tiradas sarcásticas. Morando em Nob Hill, São Francisco, num prédio que lembra o Temple Gardens de sua Baltimore, Waters comentou recentemente: Logo que cheguei aqui, morava no meu carro, a cinco quarteirões de onde estou agora. Apesar de ter uma vida melhor, eu continuo o mesmo. Atualmente, pago mais caro pela mesma roupa, para continuar parecendo um sem-teto. Eu realmente não mudei. Meu último filme (“Clube dos Pervertidos”) teve problemas com a censura. Não há diferenças. Eu era feliz antes e sou feliz agora.
(Texto cedido pelo curador da mostra)
31 de janeiro
Sala 1
17h – Desperate living** 18 anos
19h – Multiple maniacs**** 18 anos
Sala 2
18h – Problemas femininos*** 18 anos
20h – Pink flamingos*** 18 anos
01 de fevereiro
Sala 1
18h – Clube dos pervertidos* 18 anos
19h45 – Polyester* 18 anos
Sala 2
19h – Divine** 16 anos
02 de fevereiro
Sala 1
17h – Cry-Baby* 14 anos
19h – Mamãe é de morte* 14 anos
Sala 2
18h – A louca corrida do ouro** 14 anos
03 de fevereiro
Sala 1
19h - Hairspray – Em busca da fama* Livre
Sala 2
17h30 - O mundo imundo de John Waters** 16 anos
19h45 – Mondo trasho**** 18 anos
04 de fevereiro
Sala 1
19h – Cecil Bem Demente* 18 anos
Sala 2
16h - Fabulous! The story of queer cinema** 16 anos
18h – Hairspray – Éramos tão felizes*** 16 anos
20h – O preço da fama*** 16 anos
05 de fevereiro
Sala 1
17h – Multiple maniacs**** 18 anos
19h – Desperate living** 18 anos
Sala 2
18h – Vidas em conflito**** 16 anos
07 de fevereiro
Sala 1
15h - The neon woman**** 16 anos
17h - Out of the dark**** 16 anos
19h - Plagues & pleasures on the salton sea** 16 anos
Sala 2
18h – ´Til Death Do Us Part (episódio 1, 2 e 3)** 16 anos
19h30 - ´Til Death Do Us Part (episódio 4 e 5)** 16 anos
08 de fevereiro – 4ª feira
Sala 1
17h – Clube dos pervertidos* 18 anos
19h – Cry-baby* 14 anos
Sala 2
18h - ´Til Death Do Us Part (episódio 6 e 7)** 16 anos
19h - ´Til Death Do Us Part (episódio 8 e 9)** 16 anos
09 de fevereiro
Sala 1
17h – Cecil Bem Demente* 18 anos
19h – Debate O EXCÊNTRICO CINEMA DE JOHN WATERS, com o curador Mario Abbade, o colunista de O Globo Arnaldo Bloch e os atores Fernando Ceylão e Luis Salém.
Sala 2
18h - ´Til Death Do Us Part (episódio 10 e 11)** 16 anos
19h - ´Til Death Do Us Part (episódio 12 e 13)** 16 anos
10 de fevereiro
Sala 1
17h – Divine** 16 anos
19h - Desperate living** 18 anos
Sala 2
16h - Plagues & pleasures on the salton sea** 16 anos
18h - Fabulous! The story of queer cinema** 16 anos
20h – O preço da fama*** 16 anos
11 de fevereiro - sábado
Sala 1
19h – Hairspray – Em busca da fama* Livre
Sala 2
16h – Hairspray – Éramos tão felizes*** 16 anos
18h – Problemas femininos*** 18 anos
20h – Pink Flamingos*** 18 anos
12 de fevereiro
Sala 1
15h30 - Out of the dark**** 16 anos
17h30 – Mamãe é de morte* 14 anos
19h20 – Polyester* 18 anos
Sala 2
15h – Midnight Movies – From the margin to the mainstream** 16 anos
17h - Divine trash** 16 anos
19h - O mundo imundo de John Waters** 16 anos
14 de fevereiro
Sala 1
17h – ´Til Death Do Us Part (episódio 1, 2 e 3)** 16 anos
18h20 - ´Til Death Do Us Part (episódio 4 e 5)** 16 anos
Sala 2
18h – Vidas em conflito**** 16 anos
15 de fevereiro
Sala 1
17h – ´Til Death Do Us Part (episódio 6 e 7)** 16 anos
18h - ´Til Death Do Us Part (episódio 8 e 9)** 16 anos
Sala 2
18h - A louca corrida do ouro** 14 anos
16 de fevereiro – 5ª feira
Sala 1
15h – Mondo trasho**** 18 anos
17h - ´Til Death Do Us Part (episódio 10 e 11)** 16 anos
18h – ´Til Death Do Us Part (episódio 12 e 13)** 16 anos
Sala 2
16h - The neon woman**** 16 anos
18h - Midnight Movies – From the margin to the mainstream** 16 anos
20h - Divine trash** 16 anos