Críticas


PINTAR OU FAZER AMOR

De: ARNAUD LARRIEU e JEAN-MARIE LARRIEU
Com: SABINE AZEMA, DANIEL AUTEIL, AMIRA CASAR, SERGI LÓPEZ
07.12.2006
Por Luiz Fernando Gallego
O ADULTÉRIO NÃO É MAIS O MESMO...

Nos anos 1950, pelo menos no Brasil, filme francês de antes da Nouvelle Vague, com seus status intelectual, era quase sinônimo de filme de “safadeza”, com temas que não se encontravam no já dominante cinemão norte-americano. Eram filmes considerados "ousados", com enredos "picantes" e até mesmo uma (hoje modesta) nudez feminina (na época, estarrecedora). A censura brasileira da época sempre os interditava a menores de 18 anos que sonhavam com o dia em que entrariam em salas de projeção para ver tais filmes.



Bardot tornou-se o símbolo máximo disso tudo, mas havia antecedentes em Martine Carol, Michèle Morgan, Danielle Darrieux, Micheline Presle e outras que estão injustamente um tanto esquecidas. Como era de se esperar, vieram as posteriores imitações baratas de Brigitte: Pascale Petit e Michèle Mercier chegaram a ganhar marquises, mas estão mais esquecidas ainda desde o apagamento de seus dotes corporais sem nunca terem exibido talento equivalente como atrizes. O maior escândalo, entretanto veio com Jeanne Moreau em uma cena de Les Amants, de Louis Malle, proibido até 21 anos (!) por uma tomada onde, ao som de um belo tema “em crescendo” de Brahms, o semblante da atriz era de prazer igualmente crescente à medida que os beijos de seu parceiro iam descendo por seu corpo, com a cabeça dele saindo de enquadramento cinemascópico para chegar até onde o cinema ainda não havia chegado.



De modo geral, o público identificava o cinema francês da época com cinema "adulto", quase que considerado "pornográfico" para os padrões morais vigentes. Uma série de produções, devidamente relegadas ao anonimato, repetiam, de certo modo, as mesmas situações de adultério das comédias teatrais de "boulevard", as quais, na verdade, espelhavam a moral conservadora de então ao tratar de modo superficial e até mesmo algo ameno de situações amorosas e sexuais com apenas aparente liberdade e irreverência.



Não é possível deixar de lembrar desta forma tolinha e datada de “épater le bourgeois” quando se vê Pintar ou Fazer Amor, até certo ponto um filme simpático, com atores bem acima da média (Sabine Azèma sempre se sobressai, até mesmo ao lado de um ator forte como Daniel Auteil ou do competente Sergi Lopéz) e fotografia de belas paisagens que criam um clima “afetivo”, servindo bem às qualidades cosméticas da produção para, no final das contas, se assemelhar a uma espécie de mera propaganda da prática do "swing", decepcionando pela falta de curva de tensão (cômica ou dramática) no previsível desenrolar da trama a partir de sinais mais ou menos óbvios do que vai acontecer – e que acontece.



A expectativa de um giro mais esperto no roteiro não se cumpre e tudo acaba como uma versão século XXI das antigas comédias comerciais "irreverentes" do mais velho cinema francês ou das peças de Marivaux – ou de Feydeau (que sobrevive muito melhor). Piadinhas espertas e frases de efeito espalhadas ao longo da duração do filme, ainda mais quando ditas por atores excepcionais, fazem o filme engraçadinho e divertidozinho enquanto dura. Mas tudo acaba se resumindo a um certo proselitismo da prática hipócrita de "traição” (?) combinada e não-escondida do(a) parceiro(a) “oficial”, na base de "você faz, eu faço", "eu faço, você também faz", “se nós dois fazemos, sabendo o que o outro faz, e ao mesmo tempo, então... está autorizado!” – o que deixa um ranço do pior moralismo que tal "prática" encerra - não tivesse tido sua divulgação (ou origem) na sociedade americana pós-anos 1960 que se quis "avançadinha" com seu atávico puritanismo mesclado a uma “alma de Juquinha” (o garoto das piadas que só pensa “naquilo”). Reencontrar proselitismo de swingers em um filme francês dos dias de hoje não deixa de soar muito “antigo”. Acho que Nelson Rodrigues consideraria o "adultério" às escondidas mais... honesto. E jamais batizaria um dos casais de “Adão” e “Eva”...



# PINTAR OU FAZER AMOR (Peindre ou faire l´amour)

França, 2005

Direção e Roteiro: ARNAUD LARRIEU e JEAN-MARIE LARRIEU

Elenco: SABINE AZEMA, DANIEL AUTEIL, AMIRA CASAR, SERGI LÓPEZ

Duração: 100 minutos.

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