Henfil dizia preferir o cinema à tinta, e justificava: “O cinema não coagula”. Se vivo fosse, provavelmente ficaria satisfeito com Três Irmãos de Sangue, doc-homenagem a ele e a seus irmãos Betinho e Chico Mário. Quase tudo flui como as notas no belíssimo arranjo “sangüíneo” que Wagner Tiso fez para a composição Ressurreição, de Chico Mário. O projeto do filme, por sinal, foi idealizado por Marcos Souza, filho de Chico Mário, e que vem se notabilizando por boas trilhas de cinema, como as dos docs Brilhante e Evandro Teixeira – Instantâneos da Realidade.
Três Irmãos de Sangue tem colhido frutos (prêmios, simpatia) de um certo civismo documental em voga no país. Memórias de gente nobre para contrapor a nomes corrompidos e vazios que lotam a mídia atual. Parte do meio cinematográfico – incluindo parcela da crítica – se insurge, alguns silenciosamente, contra essa onda de tributos, cujo tom pode se aproximar da hagiografia. Particularmente, acho que esse tipo de restrição contextual não deve influir na análise de filmes em particular.
Este é um caso característico. O roteiro de Ângela Patrícia Reiniger e Cristiano Gualda incorre em algumas ilustrações banais, às vezes fragmenta a narrativa além do que seria desejável e assume um tom mais celebratório que informativo. Mesmo assim, consegue o principal, que é percorrer as três histórias, ao mesmo tempo em que sublinha aquilo que as unia: o apego a valores como liberdade, justiça e amor pelo país.
O filme trabalha com algumas idéias-força: a noção de “família expandida” servindo a uma concepção mais ampla de solidariedade; a concretude da política traduzida para ideais metafísicos e afetivos; a superação do limite da morte pela consciência de que todo trabalho humano pode render frutos para além da existência do autor. Tudo isso perpassa os depoimentos de e sobre os três irmãos hemofílicos que desde crianças lutaram contra o fim iminente. O investimento na emoção é compreensível dentro da opção da diretora. E até mesmo pelo caráter dos personagens. Afinal, em se tratando desse trio, a emoção sempre foi um exercício da razão.
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TRÊS IRMÃOS DE SANGUE
Brasil, 2005
Direção: ÂNGELA PATRÍCIA REINIGER
Roteiro: ÂNGELA PATRÍCIA REINIGER E CRISTIANO GUALDA
Fotografia: MÁRCIO ZAVAREZE
Edição: CASSIANO BRANDÃO
Produção executiva: MARINA DANTAS FARIA
Idealização e direção musical: MARCOS SOUZA
Duração: 103 minutos
Site oficial: clique aqui