Escrever sobre um filme como Silenciosa Luz no intervalo entre uma e outra sessão do Festival do Rio é uma tarefa não só árdua, como injusta com esta nova obra-prima (a terceira) do jovem diretor mexicano Carlos Reygadas. Silenciosa Luz deve ser absorvido no mesmo ritmo de vida da comunidade religiosa retratada por Reygadas, em que o tempo parece não passar nunca.
O que pode ser dito sem pestanejar é que Reygadas filma como poucos no cinema contemporâneo. Filma com um rigor que pode tanto soar original quanto se estabelecer uma associação direta com o cinema de Carl Dreyer – reforçada pela explícita semelhança temática entre Luz Silenciosa e A Palavra (Ordet). Consegue traduzir a passagem do tempo e a imobilidade existencial em imagens belíssimas. A beleza do cinema de Reygadas jamais é gratuita ou exibicionista. Tudo ali está justificado pelo estado emocional dos personagens, enquanto a trama se adapta ao rigor da proposta estética do diretor, numa simbiose de mão dupla que flui de maneira hipnótica.
Como em seus filmes anteriores (Japón e Batalha no Céu), Reygadas absorve o espectador, provocando-o, desafiando-o a ultrapassar o estranhamento que pode advir do tempo dilatado dos planos, dos enquadramentos fixos que aprisionam os personagens (que em alguns momentos procuram se libertar deles, como na cena em que Johan sobe num banco para parar o pêndulo do relógio e sua cabeça é cortada), da confusão provocada pela dificuldade de situar os acontecimentos no tempo e no espaço geográfico (um México habitado por personagens louros de nomes latinos e que se comunicam em um dialeto alemão). E, para coroar, termina o filme transcendendo os limites entre matéria e espírito, numa solução extremamente coerente com tudo que tinha sido visto até então.
# SILENCIOSA LUZ(Stellet Licht)
México/França/Holanda/Alemanha, 2007
Direção e Roteiro:CARLOS REYGADAS
Elenco:CORNELIO WALLS, MIRIAM TOEWS, MARIA PANKRATZ
Duração:144 min.