Críticas


FESTIVAL DO RIO 2007: PQD + BRIGADA PÁRA-QUEDISTA

De: GUILHERME COELHO + EVALDO MOCARZEL
01.10.2007
Por Carlos Alberto Mattos
PÁRA-QUEDISTAS COM E SEM FARDA

Não confunda PQD com Brigada Pára-Quedista. Ou melhor, não confunda o filme de Guilherme Coelho com o de Evaldo Mocarzel. Ambos tratam dessa tropa de elite do Exército – e é curioso que tantos filmes sobre tropas de elite tenham sido feitos ao mesmo tempo. Os dois docs se complementam na medida em que enfocam diferentes aspectos e estamentos da corporação.



Sou tentado a dizer que Mocarzel fez um filme de farda, enquanto Coelho fez um filme sem farda. Explico.



Mocarzel pretendeu compreender esse mundo de culto à rusticidade. Seus personagens são oficiais já engajados, portadores de uma retórica de “filhos da pátria amada”, ciosos de valores como dever e patriotismo. A figura central de Brigada Pára-quedista é o general Marco Aurélio, curiosamente primo do diretor de fotografia Jacques Cheuiche e genro do saudoso Mário Carneiro. Ele encarna no filme a figura de um novo Exército, que não se vê mais identificado com a época da ditadura. Impera nesse filme uma noção de ordem, que se manifesta tanto no linguajar dos oficiais como na disciplina riefenstahliana dos exercícios físicos.



No doc de Guilherme Coelho, ao contrário, reina uma certa confusão. Todos falam ao mesmo tempo, expressam-se mal, vivem a dúvida e a expectativa. PQD acompanhou durante um ano a passagem de 70 recrutas pela Vila Militar. Desses, o filme chega a particularizar cinco ou seis rapazes da periferia que esperam da brigada uma chance de melhorar de vida. Alguns serão engajados ao final do processo. Outros, menos felizes, voltarão para a vida civil. Poderão ser policiais, seguranças ou que outra ocupação (ou desocupação) o destino lhes reservar.



Guilherme Coelho fez um filme, digamos, social. Evaldo Mocarzel fez um doc, por assim dizer, intelectual. Mocarzel parece, como sempre, tão interessado nos seus personagens quanto no que o cinema pode fazer com eles. Investiga as filmagens de saltos feitas pela própria tropa. Põe os pára-quedistas para ver e discutir filmes de guerra. Deixa entrever, em filigrana, sua leitura de Guerra e Cinema, de Paul Virilio, estudo de como os militares se apropriaram de técnicas cinematográficas.



Além de revelar faces distintas de uma mesma instituição, os dois docs diferem no método e na eficácia. Mocarzel fez o seu filme como um painel atemporal, construído em grandes blocos temáticos, explorando o apelo cênico da caserna e trabalhando dramaticamente o momento do salto. O resultado é orgânico e bastante cinematográfico.



Já Coelho, ao escolher o modelo do doc-processo (o filme acompanha e registra transformações dos personagens durante certo tempo), impôs-se um desafio mais difícil. A estrutura de PQD alterna entre o quartel e a casa familiar, o que humaniza o enfoque e extrai bons contrapontos. No entanto, a curva dramática fica prejudicada por elipses bruscas, situações mal explicadas e alguma dificuldade em elaborar os personagens principais.



Apesar desses desníveis, vale a pena fazer a dupla visita – com e sem farda - a esse universo que até há pouco era tabu para os documentaristas brasileiros.



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