Críticas


A CRIADA

De: SEBASTIÁN SILVA
Com: CATALINA SAAVEDRA, CLAUDIA CELEDÓN, ALEJANDRO GOIC
13.04.2013
Por Marcelo Janot
Bem dirigido e com uma atuação espetacular da protagonista Catalina Saaveda, reflete sobre a figura da doméstica sem uma abordagem maniqueísta.

A recém-aprovada PEC das Domésticas vem gerando muito debate e polêmica, mas um benefício inquestionável já pode ser creditado na sua conta: se não fosse um dos assuntos do momento, dificilmente a ótima produção chilena "A Criada" ("La Nana") chegaria aos cinemas daqui. O filme dirigido pelo jovem Sebastián Silva percorreu o circuito de festivais em 2009, ganhando prêmios importantes, mas ficou de fora do concorrido circuito brasileiro. No ano passado ele entrou na programação do Telecine Cult com o título de "A Babá", e quando ninguém mais imaginava que fosse lançado na tela grande, eis que a PEC das Domésticas surge para dar uma forcinha.

O melhor de tudo é que o filme realmente merece ser visto e debatido, não só porque tecnicamente é bom cinema, bem dirigido e com uma atuação espetacular da protagonista Catalina Saavedra, mas sobretudo por refletir sobre a figura da doméstica sem uma abordagem maniqueísta. Em "A Criada", os patrões não são vilões escravagistas e as empregadas não são vistas como almas puras e indefesas. O que está em pauta não é a representação dos conceitos de vilania e vitimização dentro da relação profissional estabelecida, mas sim o que a presença daquele ser tão próximo e ao mesmo tempo tão distante da vida da família significa tanto para a empregada quanto para os patrões.

Filmes como "O som ao redor" nos mostram como, apesar da abolição da escravatura, ainda hoje vemos ecos de Casa Grande e Senzala. Assim como no Brasil, no Chile as domésticas ainda usam uniforme, comem na cozinha e dormem em quartos minúsculos, abrindo mão de suas vidas pessoais. É assim com a personagem Raquel, inspirada numa antiga babá do diretor. Ela é bem tratada por todos, "como se fosse da família", mas como se sentir "da família" se apenas no seu aniversário quebram-se as regras que delimitam o espaço do patrão e do empregado?

Os maus-tratos são de outro tipo: se manifestam na indiferença e no desinteresse em relação à complexidade humana de alguém que está na sua casa há mais de 20 anos. Os patrões só prestam atenção nela quando percebem sintomas de distúrbios psicológicos, e mesmo assim a solução encontrada é meramente a de contratar uma nova criada para ajudá-la.

Recheada de detalhes de observação bastante significativos, como os bichos de pelúcia em cima de sua cama ou a compra de uma blusa igual à da patroa, a narrativa abre espaço para o conflito através do embate entre Raquel e as empregadas que chegam. O resultado é uma experiência transformadora para todos, e que se não altera a consciência dos patrões quanto ao papel da empregada, ao menos mostra o quão complexa é essa relação para que seja resumida apenas a uma questão de direitos trabalhistas.

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