Críticas


PREENCHENDO O VAZIO

De: RAMA BURSHTEIN
12.10.2013
Por Marcelo Janot
Evita as armadilhas com diálogos precisos e criando uma ambiência que ressalta o confinamento físico e sentimental

Primeira cineasta mulher a fazer um filme de ficção sobre judeus ortodoxos, a israelense Rama Burshtein preenche um vazio na cinematografia mundial ao retratar um universo específico onde o papel da mulher é sempre submisso ao masculino. Em uma comunidade de judeus hassídicos de Tel Aviv, acompanhamos as angústias da jovem Shira (Hadas Yaron, premiada como melhor atriz em Veneza). Aos 18 anos, ela vive a expectativa de conhecer o seu futuro marido, mas a súbita morte da irmã, durante o parto, faz com que ela se sinta pressionada a casar com o cunhado para que o bebê fique perto da família.

Tal sinopse poderia facilmente receber um tratamento de dramalhão folhetinesco, mas a diretora evita as armadilhas com diálogos precisos e criando uma ambiência que ressalta o confinamento físico e sentimental a que é submetida a personagem principal. Shira se manifesta melhor através dos olhares ou até mesmo da música que toca no acordeon do que desabafando.

Além do olhar feminino, o que diferencia “Preenchendo o vazio” de filmes de temática semelhante, como “Kadosh”, de Amos Gitai, é a ausência de um tom de denúncia sobre o que seria um comportamento social inaceitável em pleno século 21. Apesar dos dramas enfrentados, nenhum personagem manifesta explicitamente um desejo de romper com as tradições seculares impostas pela religião – seus dilemas são os de como lidar com elas. A diretora abre as portas desse mundo para o espectador valorizando momentos ritualísticos como o Purim e a importância da figura do rabino como uma entidade suprema a quem são submetidas todas as decisões, mesmo as de foro íntimo.

No fim das contas, ela consegue transmitir o recado de que Shira só difere de outras jovens de sua idade pelo contexto social e religioso em que vive, mas suas angústias sentimentais são parecidas com as de qualquer menina de 18 anos.

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Outros comentários
    751
  • Lilibeth
    13.10.2013 às 15:58

    Parabéns, Marcelo Janot, por seu comentário crítico do filme. Simples, inteligível para qualquer público que queira uma boa dica sobre o filme. Críticos não têm que ser complicados, como a maioria teima em ser. Mesmo quem não viu o filme fica com motivação para assistir!
    • 753
    • Marcelo Janot
      14.10.2013 às 00:50

      Obrigado, Lilibeth. Volte sempre!
    809
  • Sara Roizenblit
    21.10.2013 às 18:35

    Li em uma resenha do filme que a Diretora Rama Buhrstein é religiosa ortodoxa, logo, ela é de dentro do grupo retratado. O que, ao meu ver, torna o filme e, a maneira de abordar o assunto, ainda mais interessante.