Críticas


INSTINTO MATERNO

De: CALIN PETER NETZER
Com: LUMINITA GHEORGHIU, BOGDAN DUMITRACHE, NATASA RAAB
23.07.2014
Por Susana Schild
Por se ater ao essencial, a dramaturgia atinge alcance universal.

Urso de Ouro no Festival de Berlim 2013, a produção romena Instinto Materno (Pozitia Copiluli, no original) apresenta uma trama, a princípio, rigorosamente simples: os esforços de uma mãe leoa para livrar o filho da responsabilidade pela morte de um rapaz de 14 anos. Detalhes do caso: o rebento, perto dos 30 anos, pertencia à elite ‘branca’ da sociedade e dirigia um Audi a 140 km por hora. A vítima, era de família camponesa e cometeu a imprudência de ser atingido pelo veículo.

A super-mãe poderia contratar ex-ministros da justiça para defender o rapaz, mas Cornelia aposta em sua prepotência, meios financeiros, vínculos com poderosos para reverter a situação, transformar o culpado em vítima e seguir uma vida já fraturada em várias áreas, entre elas a relação com o filho.

Com direção de Calin Peter Netzer, Instinto Materno se alinha a filmes romenos de destaque internacional (4 meses, 3 semanas e 2 dias e A Morte do Sr. Lazarescu ) pela crueza de situações e ausência de artifícios estilísticos ou estéticos para distrair o espectador.

Nesse sentido, a atuação de Luminita Gheorghiu é essencial. Uma das mais importantes atrizes do país, presente nas duas produções já citadas, ela transita com igual competência entre os espaços público e privado, separados por linha tênue para os que se dispõem a pagar o pedágio entre eles. A personagem está longe de ser simpática em seu contato com empregadas, policiais, advogados, testemunhas. Mas ama tanto o filho...

Em seu amor desmedido, Cornelia sintetiza uma sociedade sem limites – de velocidade ou na extrema flexibilidade das leis. Seu encontro com a família do rapaz morto e tentativa de inverter as posições dos envolvidos é dilacerante.

Como toda mãe, Cornelia quer o melhor para o seu filho, e mais – sabe exatamente o que é esse melhor: a impunidade, por exemplo. Custe o que custar, como revela esse filme contundente e seco, de roteiro impecável, interpretações primorosas e dramaturgia que, por se ater ao essencial, atinge alcance universal.

(Publicado em O Globo em 18 de julho de 2014)





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