Críticas


FOXCATCHER

De: BENNETT MILLER
Com: CHANNING TATUM, STEVE CARELL, MARK RUFFALO, VANESSA REDGRAVE
25.01.2015
Por Nelson Hoineff
Disserta sobre as relações de família e de poder, um esporte de ambígua aceitação e uma mente atormentada.

Foxcatcher (título original) é sobre a história de John du Pont, o milionário herdeiro da maior indústria química do mundo – que, aficcionado pelo wrestling, decidiu tornar-se treinador do campeão Mark Schultz e de seu irmão Dave Schultz nas olimpíadas de Seul de 1988, e antes, entre outras coisas, fazer de Mark o campeão mundial de 1987.

Ou não é bem assim. O filme é sobre um excêntrico milionário que, como Fausto, decide comprar a alma dos lutadores.

Assim seria, se fosse uma obra banal. Mais estritamente, porém, Foxcatcher: uma história que chocou o mundo mergulha sobre du Pont e sua relação com um mundo onde os Schultz se inserem. du Pont teve uma existência breve, acidentada e misteriosa. Aos 45 anos, casou-se com uma terapeuta de 29 anos, mas a união durou apenas cinco meses. No divórcio, outros cinco meses mais tarde, sua esposa alegou que du Pont lhe ameaçara sob a mira de um revolver e lhe atirara dentro da lareira. Com a mãe, com quem sempre viveu, John teve uma relação acidentada, parcialmente relatada no filme, especialmente no desprezo que mutuamente mantinham pelo hipismo (por parte de John) e pelos chamados “esportes inferiores” (por parte da mãe).

Não são poucos os estudos que associam o wrestling (e seu sucessor, o MMA) a prazeres não unicamente esportivos e um grande mérito de Foxcatcher consiste em inferir os vetores homoafetivos óbvios na relação entre John e Mark sem fazer uma indicação explícita neste sentido. O que faz da atuação de Steve Carell tão impressionante é justamente a capacidade de dizer tudo em silêncio, de permitir com que seus olhos e seu extenso nariz (uma notável conquista da maquiagem) digam tudo, de forma muito mais poderosa do que de qualquer outra maneira.

O diretor Bennet Miller pega seu público pelo braço e – com exceção dos últimos cinco minutos, em que é desnecessariamente literal na utilização da trilha sonora – o faz mergulhar num universo de possibilidades, onde ele vai receber informações sobre a fazenda dos du Pont, o treinamento dos Schultz, mas na verdade vai ter que descobrir tudo sozinho, o que potencializa o valor do seu conhecimento. Nisso está uma das virtudes de um grande cineasta. Miller valoriza o silêncio, os meio- tons, as sugestões e possibilidades. Não didatiza a luta, a fortuna de quem está comprando os lutadores, muito menos as razões dessa obstinação.

Foxcatcher disserta assim sobre as relações de família e de poder; sobre um esporte de ambígua aceitação e sobre uma mente atormentada. Sem literalidades, não é banal. É porém elétrico, envolvente, irrepreensível no desenvolvimento de suas possibilidades.

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