Críticas


MAPAS PARA AS ESTRELAS

De: DAVID CRONENBERG
Com: JULIANNE MOORE, MIA WASIKOWSKA, JOHN CUSACK, ROBERT PATTINSON
18.03.2015
Por João de Oliveira
Uma visão violentamente crítica do mundo falsamente mágico de Hollywood

Muitos são os filmes sobre os bastidores de Hollywood, tamanha é a fixação dos roteiristas por esse universo quase mítico. Mapas para as estrelas, o último filme de David Cronenberg, talvez seja aquele que tenha retratado esse universo da forma mais impiedosa, cruel e violenta possível. Acostumado a analisar as pulsões violentas e recalcadas dos seres humanos, o cineasta mostra o cotidiano de atrizes, agentes, assistentes e pretensos gurus e suas obsessões pelo sucesso a qualquer preço. O filme procura desmistificar o mundo supostamente mágico que envolve o star-system e apresenta uma Hollywood doente, esclerosada e sórdida.

E o processo de demitologização aparece desde o início, quando Agatha Weiss (Mia Wasikowska) chega a Hollywood de ônibus, sem nenhum glamour, para reencontrar o seu passado.

O filme não possui uma intriga propriamente dita, na medida em que evita os encadeamentos causais que tipificam o classicismo hollywoodiano. Assim, nas primeiras sequências, a história do filme não é apresentada com a função e os objetivos de cada personagem bem definidos e delineados. Cronenberg prefere apresentar a personalidade e as neuroses de cada um para melhor revelar a podridão da meca do cinema.

Temos o papel do roteirista de cinema (inspirado na vida real do roteirista do filme e interpretado por Robert Pattinson) que, enquanto aguarda a oportunidade para apresentar seus projetos, trabalha como chofer de limusine e como ator coadjuvante em pequenas séries. Arrivista, o futuro candidato ao estrelato está disposto a tudo para obter seu lugar ao sol o mais rapidamente possível.

O personagem de Benjie (Evan Bird) é um dos mais ricos e complexos do filme. Ele incarna as perigosas consequências do sucesso precoce na vida de uma criança. Aos 13 anos, arrogante, pretensioso, vulgar e excessivamente agressivo, ele tenta reencontrar o caminho do sucesso depois de algumas passagens por clínicas de desintoxicação.

Com o personagem de Havana (Julianne Moore), o filme denuncia a mitomania do meio hollywoodiano. A atriz é obcecada pela imagem materna e inventa uma relação complicada entre as duas que é negada pelo fantasma da mãe que a persegue. Além de mitômana, ela é sádica e não hesita em festejar a morte acidental de inocentes, desde que tal morte lhe abra as portas de uma produção da qual ela havia sido preterida.

O personagem de Agatha mostra a complicada relação familiar no seio da classe artística hollywoodiana. Aliás, levando-se em consideração a vastíssima literatura sobre o assunto, esse talvez seja o único bemol do filme, na medida em que os personagens parecem ligeiramente estereotipados. Essa família é representada como a própria incarnação da perversão, da obsessão quase monstruosa pelo sucesso, além de denunciar a presença de falsos gurus, charlatões e suas terapias supostamente alternativas que se aproveitariam do desequilíbrio psicológico e do estresse de uma grande parte dos profissionais da indústria cinematográfica.

Em seu retrato do universo do cinema, David Cronenberg opta por uma total desmistificação. Dessa maneira, a cartografia de Hollywood que é representada no filme, o sardônico mapa para as estrelas de seu título, não é a do luxo das grandes mansões de Hollywood, da vida nababesca e glamorosa das grandes estrelas, mas aquela de suas degenerações e neuroses. Todos os personagens principais que aparecem no filme sofrem de uma patologia ou possuem uma adição qualquer. Pessimista, o cineasta, como a polissemia do título permite supor, representa a morte como a única forma de liberdade e redenção possível em um meio tão depravado, cuja luta desesperada pelo sucesso, reconhecimento e prêmios pode acabar se transformando em arma letal.

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