Críticas


OLGA

De: JAYME MONJARDIM
Com: CAMILA MORGADO, CACO CIOCLER, FERNANDA MONTENEGRO
21.08.2004
Por Rodrigo Fonseca
ELOGIO DA PAIXÃO

A obviedade mostrou ser a moeda corrente da crítica cinematográfica em 2004 sempre que produções essencialmente polêmicas despontaram no horizonte das salas de exibição. Antes que A Paixão de Cristo, de Mel Gibson, chegasse às telas, já havia uma fileira dos adeptos do “não vi, não gostei” atirando pedras prévias no primeiro filme do ano a provocar algum rebuliço em Hollywood. Depois foi a vez de Fahrenheit 11 de Setembro fazer ferver ânimos dos que, numa postura eduardocoutiniana nada auto-reflexiva, consideraram o discurso de Michael Moore um dos sete crimes capitais. Agora, é hora de Olga.



Jayme Monjardim nem respirou, a Lumière mal acabava sua estratégia de lançamento e o coro enfurecido já estava de prontidão diante das primeiras exibições pública do longa de fuzil na mão. Pudera! O diretor de sucesso da TV como Pantanal resolveu invadir a várzea cinematográfica abrindo mão de questões históricas fundamentais para a compreensão do perfil de Olga Benário para se concentrar em sua love story com o líder comunista Luiz Carlos Prestes. Foi uma opção. Assim como foi usar o léxico com que se consagrou na tela pequena em sua incursão pelo écran. Exercitou, enfim, seu direito. Mesmo que com isso pudesse comprar os narizes torcidos dos resenhistas que, há tempos, abandonaram a busca pelo que há de magma estética nas profundezas de uma obra fílmica.



E lava fervente há em abundância em Olga. O filme tem uma energia telúrica muito específica, que não passa por reflexões de fundo historiográfico, tampouco pela análise de fenômenos de transformação política. Trata-se da paixão. Da condição trágica da paixão e todas os seus afluentes existenciais. É um romance, ponto final, narrado com o lirismo que o gênero pede, mesmo que isso venha a comprometer um arranjo prévio muito mais atraente que o resultado final. Para ir direto ao ponto: Monjardim fez um espetáculo cinematográfico velho, mas arrebatador em sua despretensão de fazer algo mais que comover. Vem daí a fúria que desperta, fazendo correr o circulante capital intelectual da superficialidade entre aqueles que compram o alienado rótulo “televisivo” que norteia as discussões sobre Globo Filmes.



Monjardim não é Rogério Sganzerla, nem Júlio Bressane. E graças a Deus que não é. Se fosse, teríamos uma mimese tola. Não a busca por um novo (e largo) passo adiante. O seu talvez não seja dos mais ousados. Mas é dos mais firmes que a recente produção nacional testemunhou. E teve na excelência de uma montagem uma vitalidade extra para conduzir seu épico passeio pela memória do Brasil de Vargas.



Mesmo com uma primeira cena constrangedora, feita apenas para mostrar a garra heróica de sua protagonista, Olga atinge um tom operístico sedutor calcado na histeria criadora de Camila Morgado. Pertence a ela e ao parceiro Caco Ciocler, talvez o maior jovem intérprete do Brasil hoje (ao lado de Selton Mello) a pólvora que incendeia a poesia de uma trama universal. Cria de Antunes Filho e Gerald Thomas, ela adotou a vontade de potência do primeiro e a alegórica ironia do segundo. Ambos os recursos beijam-se calorosamente em cena, numa composição firme com imediata comunicabilidade. Na objetiva transparência de seus objetivos, meios e fins reside a sinceridade do longa, que merece não reverência, mas o direito de ser visto sem burras cobranças de véspera.



# OLGA

Brasil, 2004

Direção: JAYME MONJARDIM

Roteiro e Produção: RITA BUZZAR

Música: MARCUS VIANA

Montagem: PEDRO AMORIM

Fotografia: RICARDO DELLA ROSA

Direção de Arte: TIZA DE OLIVEIRA

Elenco: CAMILA MORGADO, CACO CIOCLER, FERNANDA MONTENEGRO, OSMAR PRADO, ELIANE GIARDINI

Duração: 137 minutos

Voltar
Compartilhe
Deixe seu comentário