Críticas


SANGUE AZUL

De: LÍRIO FERREIRA
Com: DANIEL DE OLIVEIRA, CAROLINE ABRSAS, SANDRA CORVELONI
04.06.2015
Por Luiz Fernando Gallego
Um homem "do ar", uma moça "do mar" e muitos outros esquematismos do roteiro derrubam o filme no berço.

As primeiras imagens, ainda em preto-e-branco mostram um barco se aproximando de uma ilha oceânica (Fernando de Noronha). Após algum tempinho de percurso, vemos Daniel de Oliveira manifestando forte enjoo com o balanço do navio. Aos poucos, já a cores, ficamos sabendo que o ator interpreta ‘Zolah’, o “homem-bala” do circo “Netuno” que tem como mestre de cerimônias ‘Caleb’ (Paulo Cesar Pereio), e, dentre outras atrações, um atirador de facas (Matheus Nacthergaele) e o “homem mais forte do mundo” (Milhem Cortaz).

Também ficará claro que ‘Zolah’ tem fobia ao mar, sendo seu elemento o ar - por onde “voa” ao ser atirado do canhão circense para cair em uma rede de segurança. ‘Zolah’ na verdade é ‘Pedro’ mas não quer mais ser chamado por seu nome de batismo: natural da ilha, ‘Rosa’, sua mãe (Sandra Corveloni) o entregou, ainda menino, a ‘Caleb’ - e quando a trupe retorna à ilha ela pergunta por que voltaram.

Fica fortemente sugerido que ‘Rosa’ temia o envolvimento mais íntimo do filho com 'Raquel', sua irmã (Caroline Abras), sendo um dos ganchos do filme a tensão erótica entre o homem do ar e a moça – digamos - da água: pois Raquel pratica mergulho e acompanha turistas nessa modalidade. Eles são irmãos a ponto de realizar um incesto postergado.

Raquel vive com ‘Cangulo’ (Rômulo Braga), que tem nome de peixe, o que é dito e redito para deixar bem claro para o espectador que Raquel é mesmo identificada como um ser “marítimo”. Também são enfatizadas as reiteradas práticas sexuais de ‘Zolah’ com diversas parceiras, enquanto será insinuado que ‘o homem mais forte do mundo’ não é tão "macho" quanto sua performance sugere e que Raquel resiste à aproximação sexual de seu companheiro com nome de peixe... A serviço de qual dramaturgia surgem tais caracterizações, fica a critério do distinto público...

De esquematismo em esquematismo, o filme dividido em 4 “capítulos” não distinguíveis apesar dos títulos (“Infância”, “Angústia”, etc) e tendo como nome do circo o do deus do mar greco-romano, chega-se a um epílogo constrangedor quando Ruy Guerra (um natural da ilha) narra para crianças uma lenda (o título do epílogo é mesmo a “A Lenda do Pecado”) que busca acentuar as intenções “míticas” do tão paupérrimo quanto pretensioso roteiro. Parece haver a intenção de dar conta do que existiria entre o circense e a natureza - ou melhor, entre a arte (ainda que “naïf” do circo) e o “natural” transformado em “cultura” turística. Mas o que resta mesmo são alguns trunfos de apoio cinematográfico, como a fotografia do competentíssimo Mauro Pinheiro Jr. (de Mutum, Linha de Passe, de Era uma vez, eu Verônica, e de Cinema, Aspirinas e Urubus) que vai do breve preto-e-branco inicial para o colorido - que serve tanto a um certo clima oniróide nas tomadas circenses, como pode causar deslumbramento com o forte visual cromático da ilha - intercalado com imagens “lavadas”, como que de filme caseiro antigo quando mostra o casal de irmãos quando crianças.

Uma grande decepção vinda do diretor de dois ótimos filmes de ficção,Baile Perfumado e Árido Movie, além de autor de bons documentários (um sobre Cartola, outro sobre Humberto Teixeira), o cineasta pernambucano Lírio Ferreira. Mas o filme parece ter encantado o júri da Première Brasil no Festival do Rio de 2014 quando levou troféus de melhor filme, direção e ator coadjuvante (Rômulo Braga). Parecerem-nos mais coerentes os prêmios de fotografia e de vestuário dados em Paulínia 2014, ainda que apenas atendam ao clima um tanto folclórico do filme.

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Outros comentários
    4111
  • ivan
    09.06.2015 às 04:10

    É uma pena que a crítica não gostou, eu achei genial!