Críticas


MOUNTAINS MAY DEPART

De: JIA ZHANG-KE
Com: ZHAO TAO, ZHANG YI, LIANG SHINGDONG
12.05.2015
Por Ricardo Cota
Uma energia dramática e um interesse pelas mudanças em curso no mundo

Mountains May Depart confirma Zhang-Ke como um dos mais expressivos cineastas contemporâneos. O filme fetichiza o número três. Trata de três tempos (1999, 2014 e 2025), relações sempre triangulares e ainda utiliza três formatos diferentes de tela, que vão se ampliando a cada temporada.

O ano de 1999 é o ponto de partida da trama, quando o triângulo se concentra basicamente entre a jovem Tao (Zhao Tao) e seus dois pretendentes, o ambicioso Jinsheng (Zhang Yi) e o proletário Liand (Liang Shingdong). Logo de início as cartas do drama social são lançadas, com Tao representando o presente dividido entre o arrivismo propulsionado pelo crescimento econômico e o conservadorismo arraigado numa visão provinciana. Tao opta pela promessa de felicidade do endinheirado Jinsheng, mas não a encontra.

Na segunda parte, em 2014, ela está divorciada e sem a guarda do filho, que vive em Shangai e irá visita-la em Fenyang, terra natal do diretor, apenas quando o avô morre. Forma-se então o triângulo entre Tao, o filho, batizado pelo pai comicamente de Zhang Dollar, e a mãe postiça. Esta sequer aparece no filme, sua presença é apenas identificada pela voz transmitida do Skype.

Finalmente chegamos em 2025, quando Dollar vai morar com o pai, então milionário, na Austrália. O último triângulo é formado por Dollar, seu pai e uma professora de inglês de meia idade, com quem o jovem passa a viver uma relação quase edipiana.

Nas três etapas, Zhang-Ke aborda o tema da mobilidade social, financeira e geográfica, da inconstância do amor, da fragmentação familiar, e aproveita ainda para cutucar as barreiras impostas pela tecnologia aos relacionamentos humanos. O futuro em Mountains May Depart não é totalmente pessimista, mas está condenado à dissolução da memória, substituída pelo Google, e ao esvaziamento de temas como a liberdade, definida de forma singular numa sequência memorável pelo pai de Dollar. O cinema de Zhang-Ke destaca-se assim por uma energia dramática e um interesse pelas mudanças em curso no mundo, algo que fez muita falta em Cannes 2015.

(Publicado originalmente em maio de 2015)

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