Críticas


O JULGAMENTO DE VIVIANE AMSALEM

De: RONIT ELKABETZ, SHLOMI ELKABETZ
Com: RONIT ELKABETZ, SASSON GABAI, SIMON ABKARIAN
09.10.2015
Por Marcelo Janot
Um cenário tragicômico que parece mas não é puramente obra de ficção, expondo um dos lados mais tristes do fundamentalismo religioso.

O grau de absurdo no que se vê em “O julgamento de Viviane Amsalem” é tamanho que parece fruto da imaginação de um roteirista delirante. É inacreditável que em Israel, em pleno século XXI, o processo de divórcio ainda aconteça em um tribunal rabínico regido por leis religiosas arcaicas e machistas, onde os juízes ficam de mãos atadas caso o marido simplesmente diga não ao pedido de divórcio feito pela mulher.

Como o julgamento é longo, um pesadelo kafkiano que pode se arrastar por anos e anos, há drama, tensão e conflito suficientes para que toda a narrativa se concentre na pequena sala do tribunal. É um filme que tem sua força na palavra, seguindo a tradição do gênero “filme de tribunal”. Mas sua história poderia ser contada apenas através das imagens, tamanha é a força da expressão de Viviane (Ronit Elkabetz, que escreveu e co-dirigiu o filme com seu irmão Shlomi), em contraste com a assustadora frieza inexpressiva de seu marido Elisha (Simon Abkarian). Por outro lado, o permanente ar de deboche do irmão e advogado dele (o genial Sasson Gabai, de “A banda”) rivaliza com a sensação de revolta transmitida pelo advogado dela (Menashe Noy).

A câmera acentua a sensação de impotência e claustrofobia passeando pelo ambiente e concentrando sua atenção nos olhares. Por vezes ela se fixa em Viviane, mostrando seu olhar de desolação e dor que nos faz lembrar a Joana D’Arc de Falconetti no filme de Dreyer.

Com o marido faltando seguidamente às audiências e recebendo como punição apenas uma patética suspensão da carteira de motorista (ao que Viviane informa que ele nunca dirigiu), o julgamento já se arrasta por um ano e meio até que o juiz resolve ouvir o testemunho de familiares e pessoas que convivem com o casal para saber se há justificativa cabível para o divórcio. A alegação de Viviane de que não o ama mais, após 30 anos juntos, não é levada em conta se ele nunca a traiu ou a agrediu. O que se vê a seguir é a história do casal sendo contada através de depoimentos ora hilários, como o da cunhada perua, ora comoventes, ajudando a construir esse cenário tragicômico que parece mas não é puramente obra de ficção, expondo um dos lados mais tristes do fundamentalismo religioso.

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