Críticas


DIABO A QUATRO, O

De: ALICE DE ANDRADE
Com: MARCELO FARIA, MARIA FLOR, MÁRCIO LIBAR, NETINHO ALVES, MARIA SILVIA, JONATHAN HAAGENSEN
21.07.2005
Por Daniel Schenker
SAUDÁVEL RETORNO AO PASSADO

O Diabo a Quatro pertence a um cinema de antigamente. Mas isto não quer dizer que seja ultrapassado. Na verdade, o filme de Alice de Andrade parece remeter ao período pré-Collor, anterior, portanto, à chamada fase da retomada, composta por alguns trabalhos baseados em esforços para seduzir os espectadores, muitos deles portadores de preconceitos cristalizados após a quase interrupção total da produção cinematográfica brasileira. A postura dos realizadores pode ser sincera. No entanto, as conciliações e concessões tendem a gerar resultados impessoais, apesar de freqüentemente competentes sob o ponto de vista técnico.



Mesmo que não surja destituído por completo de efeitos de câmera, O Diabo a Quatro caminha na contramão de uma estilização denunciadora da distância entre os cineastas e o universo registrado. Alice de Andrade esquadrinha Copacabana com conhecimento de causa, não apenas no que diz respeito às externas na praia e às tomadas panorâmicas, mas, em especial, à habilidade em filmar espaços internos, a exemplo da artificialíssima decoração tropical da agência de prostituição localizada em populoso prédio misto, uma das marcas do bairro.



Além disso, O Diabo a Quatro conta, durante boa parte da projeção, com locações absolutamente comuns – portarias, garagens, áreas de serviço, cozinhas, bares e o bas-fond de Copacabana –, característica que intensifica o diálogo com a parcela descontraída do cinema nacional dos anos 80. Não por acaso, o filme evoca a informalidade de Fulaninha , de David Neves, centrado na comentada Avenida Prado Júnior. Imagens de outro trabalho – agora, do final da década de 70 – também podem vir à tona: é Tudo bem , de Arnaldo Jabor, ligado a O Diabo a Quatro pela presença comum da atriz Maria Silvia e pelo mergulho no caos nacional, diferenciado, porém, nas duas produções.



No caso do filme de Alice de Andrade, a influência documental presente em registros de meninos de rua e da paisagem da cidade partida surge mesclada a uma estrutura ficcional (mas não tão divorciada da realidade) tomada por mães ausentes e filhos alienados, patroas amalucadas e empregadas espertas, políticos desonestos e policiais assassinos. Trocando a poluição sonora de Copacabana pelo cenário silencioso e bucólico do interior de Minas Gerais, numa virada polêmica, contrastante e talvez questionável, a cineasta evidencia um pouco mais determinadas fragilidades, como a tentativa de eleger a figura materna como espinha dorsal do filme. Até então, os problemas – concentrados no personagem do apresentador de programa de auditório, interpretado por Evandro Mesquita (que volta na insatisfatória cena final) – eram atenuados pela captação precisa de Copacabana. No elenco, participações curiosas, como a da ex-vedete Ester Tarcitano, emolduram a ótima atuação de Márcio Libar.





# O DIABO A QUATRO

Brasil, 2005

Direção: ALICE DE ANDRADE

Roteiro: ALICE DE ANDRADE, JOAQUIM ASSIS, CLÁUDIO MACDOWELL, PAULINE ALPHEN, JACQUES ARHEX, JEAN-VINCENT FOURNIER

Produção: FLÁVIO R. TAMBELLINI, JACQUES ARHEX, YANNICK BERNARD, FRANÇOIS D’ARTEMARE, MARIA JOÃO MAYER

Fotografia: PEDRO FARKAS, JACQUES CHEUICHE

Trilha Sonora: LENINE, PEDRO LUÍS & A PAREDE, JOSÉ RENATO, FAUSTO FAWCETT

Elenco: MARCELO FARIA, MARIA FLOR, MÁRCIO LIBAR, NETINHO ALVES, MARIA SILVIA, JONATHAN HAAGENSEN, EVANDRO MESQUITA, ZEZEH BARBOSA, ANA BEATRIZ NOGUEIRA

Duração: 108 minutos

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