Críticas


PONTE, A

De: ERIC STEEL
24.08.2007
Por Luiz Fernando Gallego
HISTÓRIAS DE DESISTÊNCIA

The Bridge mostra a famosa ponte Golden Gate, na mesma baía de San Francisco onde a personagem de Kim Novak tentou suicídio em Vertigo (Um Corpo que Cai, de Hitchcock, em 1958. Mas só em 2004, mais de vinte pessoas se jogaram de fato da Golden Gate numa dura realidade fora dos filmes de ficção; e vários desses suicídios foram filmados por Eric Steel e exibidos neste documentário. Isto traz várias questões éticas da maior gravidade, indo além da exposição de pessoas que já morreram, muitas delas comprovadamente portadoras de graves doenças psiquiátricas em momentos de enorme perturbação - exibindo também seus familiares, entrevistados a posteriori. E ainda mais grave: um dos suicidas, por exemplo, foi filmado por muito tempo antes de pular, sendo visto andando de um lado para outro, falando em seu celular incessantemente, em atitude de evidente perturbação e desespero visível à distância. Na esperta montagem do filme, vemos seus conhecidos comentando estes telefonemas terminais. Mas jamais fica claro se o cineasta, ao ver o comportamento mais do que suspeito deste homem, teria avisado à polícia, tentado evitar o suicídio.



Em outra entrevista, um rapaz comenta como estava fotografando uma moça que havia ultrapassado a grade de proteção, indo para um parapeito de onde as pessoas costumam se jogar. Ele diz que se sentiu como um fotógrafo da National Geographic, que, mesmo vendo pela lente da câmera um tigre se aproximando, só fica fascinado com o instantâneo, sem se dar conta de que a fera estará saltando sobre ele. No caso, a moça estava se afastando da vida e o olhar através da interface do olho da câmera lhe trazia uma certa irrealidade. O rapaz conseguiu sair de sua fascinação inerte e puxou a moça para cima. Este depoimento parece traduzir uma espécie de álibi do documentarista, já que radicaliza a perplexidade dos entrevistados (e da platéia) com a questão da auto-destruição.



Há depoimentos comoventes, onde parentes e amigos buscam explicar a perda do instinto de sobrevivência por parte dos entes queridos que se mataram, perda que um não-suicida não consegue conceber. A dor de pessoas que perderam seus filhos, amigos e parceiros em suicídios talvez tenha encontrado um espaço de desabafo catártico que, esperamos, tenha sido útil para eles. Mas não deixa de haver, no todo e apesar da habilidade documental, um ar de Mondo Cane perpassando todo o filme. De qualquer modo, fica uma sugestão de que as pessoas, por mais interessadas e disponíveis em proteger os suicidas, em algum momento acabam induzidas pelos desistentes a também desisitirem de lutar pelas vidas alheias - e é surpreendente o comentário de uma senhora que recebeu um dos derradeiros telefonemas do sujeito que falava ao celular antes de se matar: desta vez ela pediu apenas que ele colocasse o número do telefone dela em um papel protegido por plástico no bolso da roupa, para que pudessem contatá-la quando ele fosse encontrado: já não havia mais esperança de cuidar do vivo, mas apenas do anunciado morto.





# A PONTE (THE BRIDGE)

EUA, 2006

Direção:
ERIC STEEL

Fotografia: PETER BALDWIN, PETER MCCANDLESS

Montagem: SABINE KRAYENBÜHL

Música: ALEX HEFFES

Duração: 93 minutos

Site oficial:
">clique aqui






Voltar
Compartilhe
Deixe seu comentário