No momento Todo dinheiro do mundo está sendo falado como o filme que teve várias cenas refeitas para substituir o ator Kevin Spacey - execrado em Hollywood após várias denúncias de assédio sexual - por Christopher Plummer.
Outro fato por trás das câmeras que virou notícia diz respeito à diferença salarial entre Mark Wahlberg e Michelle Williams para as cenas refilmadas. Ele recebeu mil vezes mais do que ela (ainda que tenha tido muito mais cenas com Plummer que precisaram ser refeitas). Ao todo não foram poucas: vinte e duas! A participação de Kevin Spacey não era absolutamente secundária, embora Christopher Plummer esteja sendo indicado a prêmios como ator coadjuvante. Ele já havia sido ventilado anteriormente para o papel do bilionário J. Paul Gatty, assim como Jack Nicholson. Do mesmo modo, o papel de Michelle Williams foi oferecido antes a Angelina Jolie e a Natalie Portman – que só não fez o filme por estar grávida na época do convite. No resultado final, fica difícil, entretanto, imaginar outros atores nos papéis que ficaram com Michelle e com Plummer. Os dois estão excelentes, e por eles já vale a pena conhecer o filme.
Também é curioso o fato de que ela, sendo uma queridinha de Hollywood e já indicada quatro vezes ao prêmio da Academia, tenha sido preterida nas indicações de 2018: tem muito mais oportunidades do que na indicação do ano anterior como coadjuvante por Manchester à Beira-mar e desfaz totalmente a má impressão deixada como atriz de musical (não é a sua praia mesmo) no fraquíssimo O Rei do Show.
Não sabemos o quanto os episódios reais do sequestro do neto de Getty ocorrido em 1973 foram modificados para atender à dramaturgia ficcional do roteiro: a intenção parece ter sido a de opor o bilionário mesquinho à sua nora, mãe do então jovem sequestrado. É neste embate, muitas vezes à distância, que Michelle e Plummer se destacam, já que, mais do que o suspense sobre o que vai acontecer (só os menos jovens talvez ainda se recordem), importa caracterizar o biliardário como um Scrooge em versão mil vezes ampliada em matéria de sovinice e mesquinhez. Daí o ótimo título do filme.
Devido à carreira tão irregular de Ridley Scott como diretor, surpreende o bom resultado obtido num filme relativamente “pequeno” em confronto com suas superproduções mais habituais. Ainda mais, com a intercorrência de ter refilmado 22 cenas em apenas oito dias ao custo de dez milhões de dólares. Nada disso se faz notar como elemento adverso ao que o filme consegue atingir em termos muito satisfatórios. Apenas uma pequena esticada perto do final, visando incrementar o suspense, seria dispensável. Também não chega a atrapalhar o peso da idade no rosto de Plummer (88 anos) em cenas de flashback passadas em períodos muito anteriores ao de quando o personagem aparece mais, aos 80, quando seu neto de 16 foi sequestrado.
A trilha musical evoca trechos de óperas, já que o centro da ação física se passa na Itália: sem uso abusivo e em intensidade de som moderada, desta vez poderia até mesmo se fazer mais audível do que o habitual em filmes atuais.